Texto porVictória Silva
Jornalista, Santos

Essure, contraceptivo permanente, ainda motiva o sofrimento de mulheres

Quando Mônica Estellita Pessôa descobriu que estava grávida de seu quarto filho, em 2014, tomou a decisão de fazer uma laqueadura junto ao parto. Assim que comunicou o obstetra, recebeu uma negativa como resposta.

Dois de seus partos haviam sido normais e, por isso, a cirurgia não seria possível.

Tempos depois, já com o bebês nos braços, surgiu uma nova esperança: o Essure.

Sem cortes, dores ou qualquer anestesia

Em outras palavras, essa era a solução que o planejamento familiar da paulistana precisava.

“Para mim aquilo era perfeito. Eu tinha dois bebês, além dos dois filhos maiores, então colocar o dispositivo em 20 minutos e ir para casa era um sonho”, conta.

Fabricado pela Bayer e incorporado pelo SUS em 2012, o Essure foi vendido a mulheres no mundo todo como uma alternativa moderna e menos invasiva em comparação à laqueadura. Em resumo, esse seria um dispositivo contraceptivo permanente.

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Para isso, um par de molas de cerca de 4 centímetros feitas de aço inoxidável, fibras de tereftalato de polietileno (PET) e cobertas por uma liga metálica de níquel e titânio era implementado nas mulheres. No procedimento, que Mônica ouviu que levava apenas 20 minutos, essas molas eram posicionadas nas tubas – a passagem que liga as trompas ao útero. Deste modo, impediriam o caminho do óvulo até o colo do útero e, consecutivamente, a fecundação.

Tudo perfeito. Não fosse o pesadelo que estava por vir, tanto para ela quanto para todas as mulheres que compraram a ideia.

“Na hora em que colocaram na primeira trompa, já senti uma dor horrível. Mas imaginei que fosse um incômodo passageiro e que valeria a pena, tendo em vista a qualidade do tratamento”, conta.

Acontece que as dores eram só um indicativo do que estava por vir. Ainda em 2015, as dúvidas sobre a segurança do Essure tiveram início no Canadá. Dois anos depois, o dispositivo já estava fora de circulação tanto no país quanto nos Estados Unidos e em toda Europa.

“Passei a ficar menstruada o mês todo”

As dores que Mônica sentiu ainda no hospital se tornaram constantes. Passado um mês, a menstruação desceu como uma hemorragia e nem mesmo o uso de anticoncepcional resolveu o fluxo desregulado.

Então vieram inchaços, quedas de cabelo, indisposição, dores no corpo, problemas com acne… A lista de efeitos colaterais do Essure é imensa. Em comum, todos são uma reação à presença em excesso do níquel no organismo. Já que, quando ultrapassa o limite comum, o metal torna-se tóxico.

“Os médicos nunca relacionaram o que eu sentia ao Essure. Só tive esse entendimento quando ele foi proibido no exterior”, conta Mônica.

Com esse conhecimento, o sofrimento ganhou uma nova nuance. Era necessário encarar a descrença e a ironia dos médicos.

Vítimas do Essure são tratadas como loucas

Quando entendeu o motivo da série de problemas que tinha, Mônica voltou ao hospital orientada por um médico americano a retirar o dispositivo de seu organismo. No consultório, ouviu risadinhas e questionamento se ela tinha noção do valor daquela tecnologia inovadora.

Estava custando seu bem-estar. E ela queria tirá-lo o quanto antes.

Depois de muitos questionamentos, Mônica conseguiu retirar o dispositivo. Já Lorena Alves ainda não conseguiu retirar o dispositivo e segue sentindo todos os sintomas de sua presença em seu organismo.

“Quando eu fui colocar me disseram que era um dispositivo de titânio. Só soube da presença do níquel depois que já tinham colocado”, conta.

Apesar de descobrir o níquel quando recebeu o certificado do dispositivo, o entendimento de o que estava acontecendo veio apenas após encontrar os relatos de outras vítimas no Facebook.

Atualmente, milhares de vítimas do Essure estão se unindo para pedir tanto indenização pelos danos provocados pelo produto quanto a retirado do mesmo do sistema. Os grupos, organizados por estados, trocam experiências e se mobilizam via WhatsApp e Facebook.

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibiu a venda do dispositivo em 2017. Mas, logo em seguida, ele voltou a ser comercializado e atualmente continua sendo utilizado no Sistema Único de Saúde (SUS).

Sou uma vítima do Essure, o que fazer?

Atualmente, o escritório de advocacia PGMBM representa as vítimas na justiça. Se você está sofrendo efeitos colaterais após a implantação do Essure pode procurar os grupos de apoio para orientações. O Vítimas do Essure está no Facebook e tem um site.

A ação coletiva busca uma reparação e também o direito de realizar a histerectomia total, um desejo das próprias vítimas. Em outras palavras, a retirada completa do útero e, deste modo, evitar novas complicações.