Texto porVictória Silva
Jornalista, Santos

Caminhar pela estrada velha de Santos, uma descoberta sensorial e histórica

O universo da Estrada Velha de Santos é diferente dos outros. Por lá, o tempo acelera na subida e passa mais devagar na descida. As cores são saturadas, os aromas, fortes e os sons, uma verdadeira orquestra animal. Na sombra, a brisa é tão fresca quanto um potente ar-condicionado. Além disso, a natureza aprendeu a viver em harmonia com o asfalto.

Tudo em uma rodovia que não vê carros desde 1985. E fica a pouco mais de 50 km de Santos.

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Quem aceita o desafio de caminhar pelas curvas da estrada de Santos – que, ao contrário do que muita gente pensa, não é aquela citada por Roberto Carlos – encontra pela frente uma rota de descobertas. Uma parte da história da região e algumas belezas inimagináveis vivem no decorrer de 9km e cerca de 4 horas de caminhada, que agora pode ser feita sem guia. 

O Caminhos do Mar, no Parque Estadual da Serra do Mar, voltou às atividades no fim de julho. Estava fechado por conta da quarentena.

O acesso ainda é restrito e apenas para pessoas, pelo lado de São Bernardo do Campo.

Por enquanto, o parque recebe apenas 30% da capacidade e os espaços fechados, como biblioteca, sala de atividades, centro de visitantes, museu, hospedaria e orquidário, seguem fechados.

Vale lembrar: o uso de máscaras é obrigatório durante o passeio, assim como o distanciamento social. Leve, além do protetor solar, seu álcool em gel e máscara para trocar no trajeto.

Tudo sobre o passeio na Estrada Velha de Santos

São 10 horas quando chego ao Parque Estadual da Serra do Mar. Um casal se alonga para enfrentar a caminhada.

Isabel, o falcão mascote da equipe do parque, observa o movimento daquele domingo do alto da placa que dá boas-vindas aos visitantes.

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Se soubesse contar, Isabel teria contabilizado cerca de 100 visitantes até aquele momento. Casais, famílias com crianças e idosos, grupos de ônibus e até mesmo pessoas sozinhas estacionaram na portaria de São Bernardo do Campo e seguiram para a aventura. Tênis confortáveis e câmera nas mãos são regra entre todos. Agora, na fase amarela do Plano SP de enfrentamento ao coronavírus, o álcool em gel e as máscaras também.

Os passeios autoguiados começaram em fevereiro de 2020. Acontecem aos sábados e domingos, com saídas a cada 30 minutos, das 9h às 11h30. Enquanto o tradicional, feito em grupos e com guias, acontece desde 2005 às quartas, quintas e sextas-feiras. Em resumo, a diferença é que a nova opção dá ao visitante a possibilidade de curtir da maneira que achar mais conveniente para si.

“Tem gente que começa a caminhar e percebe que fazer os 9km é muito puxado. Então voltam antes ou  fazem paradas mais longas no caminho”, explica a guia Drielly Martins.

Antes do coronavírus, também havia opção de iniciar o passeio por Cubatão e subir a serra.

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Em nossa visita, Drielly nos orientou a caminhar até o marco de 5km, onde fica o último monumento histórico, e retornar. Quem encara a descida completa encontra diversas cachoeiras nos últimos 4km, mas precisa de um transporte próprio para voltar ao estacionamento em São Bernardo.

O que aprendi no Caminhos do Mar

Aceitamos a dica da guia e nos juntamos ao casal observado por Isabel. Alongamento feito, a caminhada começa em um dos únicos trechos planos da estrada velha de Santos. Estamos sob a ponte que atravessa a represa Rio das Pedras (interligação entre a Billings e a Guarapiranga). Ali, ainda não é possível saber exatamente o que nos aguarda no decorrer dos 5 km de descida da estrada velha de Santos.

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Sim, a descida tem 1km a menos do que a subida. Isso porque existe um pequeno desvio para conhecer o primeiro monumento histórico do passeio: a casa de visitas.

A construção, de 1926, foi projetada por Ramos de Azevedo. Ou seja, o mesmo arquiteto responsável pelo Teatro Municipal de São Paulo e pelo Mercado Municipal. Com apenas um andar e envolta pela Mata Atlântica, a casa nunca teve moradores. Sua função era receber engenheiros, arquitetos e outras “pessoas importantes” que queriam conhecer a construção da Usina Hidroelétrica Henry Borden.

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O interior da casa não tem móveis, apenas uma exposição que conta um pouco mais sobre a usina.

Primeiro quilômetro andado, estamos no portão da estrada e prestes encarar as curvas e declives da estrada de Santos. É bom estar com uma roupa leve e ter uma garrafa d’água em mãos. Protetor solar e repelente também são itens de primeira necessidade.

Um ‘uau’ a cada curva da estrada de Santos

O trajeto inteiro apresenta um contato íntimo com a Mata Atlântica e permite uma verdadeira contemplação da vista da Baixada Santista. Parei inúmeras vezes para observar a região de cima e voltei com o cartão de memória lotado.

Também é uma maneira de entender os costumes da sociedade paulistana no período colonial. Pois ali estão monumentos tombados como patrimônio histórico:

  • Pouso de Paranapiacaba;
  • Rancho da Maioridade;
  • Calçada de Lorena;
  • Padrão Lorena e trecho em macademe.

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A arquitetura do Pouso de Paranapiacaba é lindíssima e a vista de lá também é maravilhosa. Mas o que me chamou a atenção é o motivo da construção: uma parada para os viajantes descansarem e verem a vista.

A Calçada de Lorena, por outro lado, é apenas uma calçada e, ao mesmo tempo, um grande marco histórico. Trata-se da primeira calçada pavimentada que ligava a capital paulista e Cubatão.

No caminho entre cada um dos monumentos históricos, ficam atrações não construídas pelo homem e que são tão belas quanto as já citadas. A ‘Curva do Uau’, por exemplo, é um mirante de onde dá para ver toda a Baixada Santista. Duas pequenas amostras das cachoeiras que estão mais pro fim da estrada também encantam pelo caminho – ótimos momentos para lavar as mãos e o rosto e dar aquela refrescada.

Se você observa a tubulação branca na serra sempre que vai a São Paulo, ver os tubos bem de pertinho também será um grande momento do passeio. É possível os equipamentos de uma das usinas hidrelétricas mais antigas do Brasil e entender como ela funciona (mas isso fica como pauta para outra matéria aqui no Juicy Santos!) durante o passeio.

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Cada caminhada pela Estrada Velha de Santos é única

Em resumo, caminhar pela estrada velha de Santos é um desafio e um aprendizado.

É cansativo, não vamos mentir. Mas um passeio incrível para quem ama natureza e história, principalmente. O valor da entrada é R$ 32, tanto para a trilha autoguiada (que nós fizemos) quanto para na companhia de guias, e pode ser comprado online ou na hora (de acordo com a disponibilidade). Atualmente, o início ocorre apenas na cidade de São Bernardo do Campo, ou seja, é preciso ir até lá de carro.

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O universo, por lá, é outro. Dos 365 dias do ano, apenas 60 costumam não ser chuvosos ou repletos de neblina. Tivemos sorte na nossa visita e conseguimos aproveitar tudo com muito sol e um céu tão azul quanto os de uma pintura. Além disso, uma pequena cobra pediu licença para aproveitar o calorão e atravessou em nossa frente em um desfile lento e gracioso.

Não deu tempo de registra-la passar. Estamos em ritmos diferentes naquela descida.

Portanto, se você quer fazer um passeio perto de Santos para respirar ar puro e estar em contato com a natureza e a história do Brasil, coloque o Parque Caminhos do Mar na lista.

Anote: o acesso está disponível temporariamente (enquanto durar a fase amarela do Plano SP) apenas pelo lado de São Bernardo do Campo, de segunda a sexta, das 10 às 16h, mediante agendamento com 24 horas de antecedência, pelo site da Fundação Florestal.