Texto porFlávia Saad
Santos (SP)

Elas são o motor da economia criativa em Santos e no Brasil

Uma cidade criativa vive, essencialmente, de pessoas. Se Santos faz parte desse seleto grupo desde 2015, é porque aqui estamos lutando para transformar a cidade por meio da criatividade e o empreendedorismo.

E são algumas características tipicamente femininas, como sensibilidade, coragem, resiliência e a vontade de fazer acontecer que impulsionam todo esse movimento.

No Brasil, existem mais de 24 milhões de empreendedoras mulheres. Destas, 80% tocam seus negócios sozinhas. Esse protagonismo passa, quase sempre, pela economia criativa.

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Portanto, neste mês da mulher, começando com esta matéria especial, o Juicy Santos vai mostrar histórias de quem ajuda a construir um mercado local fortalecido e cheio de cores únicas.

O ecossistema é delas

Uma das plataformas a movimentar a economia criativa em Santos, como já falamos em O que faz de Santos uma cidade criativa, são os bazares que incentivam o consumo consciente diretamente de quem produz.

Na edição de março de O Coletivo, que rola nos dias 7 e 8 de março em Santos, cerca de 90% dos 60 estandes têm mulheres à frente.

Mais do que isso: eventos como O Coletivo funcionam como uma parte fundamental do ecossistema que faz a economia criativa girar.

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Criado em 2015 por Aline Tolotti, hoje representa uma das iniciativas mais importantes em termos de fortalecimento da economia criativa em Santos. Conseguiu formar, em torno de uma comunidade de empreendedores e consumidores, um ecossistema seguro e sustentável.

Artesã e produtora de eventos, Aline percebeu, por conta da sua marca Na Casa Dela Tinha, que não só faltavam espaços para os empreendedores ocuparem, mas também havia uma demanda de uma comunidade ávida por novos jeitos de consumir. E, a partir de um trabalho intenso e cheio de amor de Aline, o santista abraçou de vez esse verdadeiro estilo de vida.

Muito mais do que acessórios pro cabelo

Camila Araújo, da Chinua Acessórios, se descobriu empreendedora ao mesmo tempo em que resgatou sua força de expressão como mulher negra.

Há mais ou menos 5 anos, ela iniciou o próprio processo de transição capilar. À época, percebeu que havia muita gente, como ela, querendo comprar acessórios que fossem, ao mesmo tempo, funcionais e representativos de suas origens. Além disso, produzir essas peças reafirmava o próprio amor de Camila pelos trabalhos manuais.

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“No meio do caminho, fui percebendo que a cada peça que eu vendia gerava, além da renda em si, conexões de afeto e autoestima para minhas clientes. Elas me contavam sobre como se sentiam mais poderosas, seguras e confiantes. A partir dessas experiências, passei a repensar a marca e venho encaminhando-a para o que de fato ela é. A Chinua está em transformação para ser uma plataforma de encontros, trocas e diálogos potentes sobre mulheres, consumo consciente e sustentabilidade. Pelo menos 60% de nossas colaboradores são mulheres negras e artesãs locais”.

Hoje, 100% dos acessórios é feito de tecidos originais vindos do continente africano. Isso criou um movimento de valorização individual e coletivo de força e ancestralidade.

A história de Camila se assemelha à de tantas empreendedoras criativas por aí. Pega uma dor e um questionamento próprios da mulher ou de um grupo e transforma não apenas em economia, mas em propósito de vida e plano de negócios.

O que é economia criativa (e por que as mulheres se dão bem nessa área)

A economia criativa proporciona o desenvolvimento das localidades. É o que diz a teoria do urbanista Charles Landry, que surgiu lá pelos idos dos anos 90.

Áreas como moda, gastronomia, música, artesanato, artes visuais, comunicação, arquitetura, audiovisual, novas mídias e serviços criativos, antes até consideradas menores dentro de um contexto econômico, hoje propulsionam e transformam vidas e cidades.

Economia criativa, na nossa visão, tem a ver com empoderamento. Com enxergar oportunidades, utilizar seu repertório, fazer surgir um ambiente favorável para transformações, encontrar respostas, gerar renda e empregos e produzir com afeto e responsabilidade ambiental e social.

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Assim, relacionar empreendedorismo com mulheres, compartilhamento de conhecimento e criatividade faz MUITO sentido.

“Tenho três princípios básicos que guiam meu pensamento sobre Economia Criativa. O primeiro é que todo mundo é criativo. É o que chamo de princípio da universalidade. O segundo é que criatividade precisa de liberdade, para que possamos sair da vida interior, para a exterior, para a sociedade. E o terceiro, é que essa liberdade tem de ser exercitada em mercados comerciais, que envolvem a economia criativa”, John Howkins

Nadar pra maré não levar

A mulher, especialmente a mulher negra, sempre se virou pra ganhar a vida. Nem sempre esse jogo teve o nome bonito de empreendedorismo feminino.

“Se a gente para pra pensar, mulheres negras sempre se viraram com o que tinham em suas mãos, é o conceito de ‘sevirologia’. Somos empreendedoras nas favelas, a tia do lanche, a tia do camelô e isso, sem dúvidas, movimenta muito a economia. Segundo dados o Data Favela e Locomotiva, as favelas hoje tem poder de compra de R$1198 bi, isso é superior a países inteiros como Paraguai, Uruguai e Bolívia. Hoje só não vê quem não quer, pois estamos em movimento e criamos de tudo”, explica Camila, da Chinua. 

Infelizmente, por conta do machismo e do racismo, a cara do empreendedor de sucesso que aparece na grande mídia é a do homem branco jovem.

Vilene Lacerda nasceu em São Paulo e mora há 5 anos em Bertioga. Ela conta que nem sabia que aquilo que fazia com a Flavor Sex se chamava empreendedorismo. Ela vendia chocolates eróticos em bares e casas noturnas. Para entender seu papel como mulher negra e periférica – e também crescer seu negócio -, ela buscou cursos e coletivos para aprender a empreender.

“Meu sonho era ser uma articuladora social e poder ter voz em outros lugares. Poder falar as dores de como é sobreviver na periferia. Com isso, realizei a primeira feira preta em Bertioga e isso só foi possível por causa da conexão de pessoas que acreditaram na ideia”, conta. 

Além da Feira Preta da BS, Vilene produz o sarau feminista Elas na Quebrada. Para ela, mais do que organizar eventos e ter dinheiro no bolso, o empreendedorismo mexe com a autoestima e o autoconhecimento de todas as mulheres.

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“Ainda tenho muito o que aprender, estou no início da minha caminhada. O melhor de tudo isso é o reconhecimento. Da mesma forma em que estou me transformando a cada dia, estou levando arte e educação para as demais mulheres da periferia”. 

Aceleradas

Juntamente com Camila, Vilene participou de um programa de aceleração made in Santos, chamado A Colaboradora. Concebido pelo Instituto Procomum, o projeto Empreender e Transformar capacitou, ao longo de um ano inteiro, 25 empreendedores criativos da região da Baixada Santista.

Isso aconteceu por meio de oficinas, mentorias, redes de contato e um espaço de trabalho para desenvolver os negócios de impacto social. A primeira turma se forma neste mês de março, com evento no Procomum para debater a importância da economia criativa como ferramenta de mudança.

Se depender de pessoas como Camila, Aline, Vilene e da gente, aqui no Juicy Santos, isso vai mudar.

A porta está aberta para o novo. Vamos entrar nesse novo espaço juntxs?

Ao longo do mês de março, o Juicy Santos vai contar histórias de mulheres que contribuem para a economia criativa em Santos e região. Acompanhe a gente no Instagram, no Facebook e aqui no site pra conhecer essas minas incríveis.