Texto porSuzane G. Frutuoso

Devemos olhar com mais carinho para nossos idosos após a quarentena

“Além de bolinho de chuva, o que mais?”
“Humm… Lasanha, mãe!”
“Tá bom! Só isso?”
“Bacalhau ao forno com batatas também…”

Pelo telefone, minha mãe e eu falamos sobre comidas gostosas que ela fará pra mim depois da quarentena e restaurantes legais que ainda não fomos e queremos conhecer.

Por enquanto, nas duas vezes por dia que ligo para ela e meu pai, pergunto se ainda tem bastante coisa na geladeira e na despensa. Uma amiga minha, a Silvia, está fazendo as compras para eles.

Mãe e eu já combinamos de levar a Sil pra jantar quando as coisas melhorarem.

Das angústias que carrego (estão mais sob controle, não sei por quanto tempo) neste isolamento, uma das principais é se meus pais estão saudáveis, bem alimentados, confortáveis, se distraindo. Se eu consigo manter esse estado de “normalidade” mesmo a 80 quilômetros de distância deles.

www.juicysantos.com.br - idosos importam

Às vezes, me envergonho quando lembro que antes deste novo normal que vivemos eu ligava pra eles só de duas a três vezes por semana. E muita gente está com esse sentimento de “não estava olhando para meus velhinhos como deveria”.

Alguns amigos piraram nas recomendações. Ficaram realmente desesperados, especialmente os que estão separados de suas famílias por estradas inteiras.

Teve gente querendo sair com o chinelo na mão no meio da rua gritando para os pais: “já pra dentro! Vou contar até três!”.

Um ensinamento da quarentena

Talvez essa seja nossa primeira grande lição de quarentena estapeada na cara: idosos importam. Muito!

Em um mundo onde há uma excessiva busca pela eterna juventude, valorizar os mais velhos e suas histórias, suas presenças, estava em segundo plano. Que erro o nosso…

A finitude, claro, sempre nos acompanha. E acompanha as pessoas que a gente ama. Mas não paramos para pensar nisso nunca.

Temos, agora, um inimigo invisível que serve à mesa essa verdade 24 horas por dia de isolamento.

E ele ri dizendo que podemos fazer tudo certo e ainda assim nada se garante.

Ele ri ainda mais alto encarando nossos olhares amedrontados enquanto ressalta “idosos são grupo de risco”.

Então, tenham amor e paciência. Liguem muito, liguem sempre.

Mandem e-mail, stories, direct, messenger, WhatsApp, carta.

Façam as chamadas de vídeo.

Aqui vale lembrar de um cuidado essencial para que não se torne mais um erro nosso: forçar o uso da tecnologia com quem não se sente à vontade.

Quem me conhece sabe que eu considero a tecnologia, ao lado da ciência e da medicina, uma das mais incríveis invenções da humanidade.

A tecnologia sem dúvida diminui a saudade de corações separados. Mas dê a pais e avós a chance de conversarem como estão mais acostumados. Para muitos ainda é pelo telefone. Pelo telefone fixo.

Tudo bem ensiná-los a usar todos os gadgets e meios eletrônicos para manter o contato. Pergunte, porém, como querem conversar.

Minha mãe gosta de falar pelo telefone. Com meu pai eu troco muitas mensagens de Whatsapp e no Messenger. O pai está mais acostumado com chamada de vídeo. A mãe gosta de ver a mim, meu irmão, minha cunhada e meu sobrinho por vídeo, mas prefere que o pai esteja junto pra atender e tal.

Mais do que nunca, faça as vontades dos seus velhinhos.

Adapte-se àquilo que deixá-los o mais tranquilos possível. Não é hora de fazê-los se sentir deslocados em um mundo onde tudo agora depende de nuvem e wi-fi. De fazê-los achar que essa realidade não é pra eles. É sim. Nós é que temos obrigação de ajudá-los com a mesma dedicação que eles tiveram e ainda têm pela gente.

Suzane é santista e cofundadora da plataforma Mulheres Ágeis e da consultoria ComunicaMAG. É jornalista, mestre em sociologia, professora e escritora. É autora do livro “Tem Dia Que Dói – mas não precisa doer todo dia e nem o dia todo”. Mãe orgulhosa da vira-latinha Charlotte e da gatinha Jeannie é um Gênio.