Texto porVictória Silva
Jornalista, Santos

Rotina do coronavírus: como vivem os pacientes infectados pelo COVID

No início de março, Felipe Torelli estava vivendo sua vida normalmente, assim como todos nós.

No dia 10, por exemplo, o santista e toda a equipe de seu escritório de arquitetura foram a São Paulo conferir as novidades apresentadas na Expo Revestir, no Transamerica Expo Center. Eventos ainda não tinham começado a ser cancelados no Brasil e pouco se falava sobre o coronavírus nos noticiários. Dias depois, caminhando por entre os canais da cidade, ele encontrou uma amiga de longa data que estava há tempos nos Estados Unidos.

Uma abraço.

Uma conversa rápida sobre como ia a vida.

Um beijo de despedida.

E, em poucos dias, a rotina do coronavírus começou

De acordo com informações da Prefeitura de Santos, já são mais de 500 casos confirmados de coronavírus em Santos (dados de 27 de abril). Já morreram 38 santistas da doença. E a gente ouve que é preciso ficar em casa para evitar que o vírus se espalhe.

Mas, apesar da quantidade de conteúdos sobre o tema, é difícil entender do quê, de fato, estamos nos protegendo.

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O Presidente da República definiu a doença como uma gripezinha e, em paralelo, o sistema de saúde de Manaus entrou em colapso por conta do COVID-19. E então fica a dúvida: com o quê, de fato, estamos lidando?

“Pensei que ia morrer”.

É assim que Torelli define a sensação de receber o diagnóstico positivo para o COVID-19.

Juliana Gorla, santista e também infectada pelo vírus, relata a experiência com as mesmas palavras.

Os dois estão fora do grupo de risco – pois têm 40 e 37 anos, respectivamente. Além disso, não apresentam histórico de doenças pré-existentes e mantêm uma rotina de atividades físicas e alimentação saudável. Ainda assim, a rotina do coronavírus deixou ambos assustados e alertas quanto à necessidade de manter a quarentena.

Não conseguir respirar é um verdadeiro pesadelo

Assim como Torelli, Juliana estava mantendo uma rotina normal no início de março. Na segunda-feira em que a quarentena foi decretada em Santos, ela foi ao mercado fazer compras para evitar sair de casa nos dias seguintes.

Um trajeto feito parte em um carro de Uber e parte andando. Quando chegou em casa, guardou as compras e iniciou sua rotina de home office. Dois dias depois, a empreendedora já começou a sentir os primeiros sintomas do coronavírus. Inicialmente, imaginou que fosse dengue e ficou em casa. Porém, três dias depois, a situação piorou e ela decidiu ir ao médico.

“Fiz uma tomografia e os médicos viram que meu pulmão não estava legal. Explicaram que eu me encaixava como suspeita do COVID-19 e mandaram ficar em casa em isolamento total”, explica.

No primeiro momento, o exame não foi feito, pois apenas pacientes internados recebiam o teste. O isolamento total começou, mas não a tempo de evitar que o marido e o filho também fossem infectados.

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Enquanto a experiência dos dois foi mais ameno, Juliana teve o quadro agravado e teve que ser internada às pressas.

Na Santa Casa de Santos, ficou um dia na ala hospitalar para, em seguida, ser levada para a UTI. De acordo com seu relato, ela não tinha uma simples falta de ar. A dificuldade tornava o simples ato de respirar praticamente impossível.

Cada caso é único, mas igualmente terrível

Quando Juliana teve alta, Torelli estava começando a sentir os primeiros sintomas. Como pratica atividades físicas, imaginou que as dores fossem fruto de um mau jeito e se automedicou. Não surtiu efeito. Dias depois, ele ligou para o médico para saber se deveria ou não ir ao hospital.

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“Ele me aconselhou a continuar em casa, pois naquele momento, os hospitais já estavam cheios e tinha bastante gente infectada”, explica.

A chegada da tosse e da falta de ar fez o conselho do médico mudar: era para ele ir ao hospital imediatamente. Assim que chegou ao hospital, o arquiteto fez uma tomografia, exames de rotina e o teste do coronavírus. Estava com 25% do pulmão comprometido e deveria ficar em isolamento total até o resultado do teste de COVID-19 chegar. De acordo com ele, os dias de espera foram de puro sufoco e receber o resultado não aliviou a tensão.

“Do momento que você acorda até a hora que vai dormir, todos os lugares falam sobre o mesmo assunto. TV, internet, rádio.. Você vê muita gente morrendo e outro monte de gente espalhando fake news sobre o assunto. Eu pensei que ia morrer”, comenta.

Diferentemente de Juliana, que passou alguns dias na UTI, Torelli não chegou a ser internado e fez todo o tratamento em casa. Segundo conta, o mais importante era beber muita água e manter uma alimentação balanceada.

De alta, ele segue totalmente isolado e diz que continua em casa até que a situação se normalize.

Nem todos os finais são felizes

Tanto Juliana quanto Torelli relatam o atendimento que receberam no hospital com muito carinho. Adjetivos como “excelente” e “impecável” são comuns em ambos os discursos.

E é assim também com outros pacientes. Mas, por maior que seja o cuidado dos médicos e profissionais de saúde, nem todos os finais são felizes. Lurdes Albuquerque (nome fictício) é sobrinha de uma paciente que faleceu em decorrência do coronavírus em Santos.

“É uma situação de total impotência, sabe? Meus primos não querem falar sobre o assunto e eu entendo eles totalmente, pois é realmente terrível. Não desejo para ninguém”.

Para quem não sabe, as orientações do Ministério da Saúde é para que falecidos em decorrência do coronavírus (ou suspeitos) não tenham velórios que juntem muitas pessoas.

Por isso, a cerimônia deve ter, no máximo, 10 pessoas e respeitar a distância mínima de dois metros entre elas. Além disso, o caixão deve permanecer fechado e pessoas que pertencem ao grupo de risco não deve participar.

Em outras palavras, as famílias não têm a oportunidade de se despedir de seus entes queridos. Algo que, no início de março, ninguém imaginava que fosse acontecer por aqui.