Texto porLuiz Fernando Almeida

Um post homofóbico? Sim ou não?

Na segunda-feira à noite, me deparei com um post na minha timeline que me deixou um pouco intrigado.

A postagem, que já foi apagada, questionava o espaço que a Rede Globo tem dado à população LGBT, representada, atualmente, em grande parte das novelas da casa.

novela

Tive que reler o post umas cinco vezes, pra ver que ali, em minha opinião, existe homofobia. E aquela homofobia velada, sabe? Mas está ali.

Pedi que um amigo hétero lesse pra ver o que ele achava, já que ele vive em outro universo e não poderia ter uma opinião ” vitimizada” e a resposta não foi outra: post homofóbico!

O que me chocou mais ainda, foi ver que foi escrito por Sandro Valente, produtor cultural da região. Oras, se você trabalha com cultura, não dá pra ser homofóbico. Afinal de contas, os gays movimentam esse mercado e sem eles, o seu trabalho de produtor local não aconteceria.

Educadamente, comentei o post, afirmando que passei 40 anos assistindo novelas mostrando a realidade das famílias convencionais e que somente agora, mesmo não concordando muitas vezes, com a forma que os gays são retratados, tenho a possibilidade de assistir uma novela e me sentir representado ali.

Pois bem, após meu comentário, começaram a chover outros, EXTREMAMENTE HOMOFÓBICOS, postados por homens, mulheres, em sua maioria pais e mães, todos os amigos dele. O senhor Roberto Santista e o senhor Patinar em Santos foram os que se mostraram mais radicais e que sentem um ódio maior pelos homossexuais. Ambos postaram comentários dignos de cadeia. Qualquer advogado mais sanguinário adoraria tirar uma grana deles.

Meu amigo Marcio acompanhou tudo e se manteve ali comigo, rebatendo todos os ataques. Até que a coisa ficou insuportável e comecei a marcar outros amigos. Essa brincadeira começou às 22h e estendeu-se ate às 4 da manhã. Pronto: instaurou-se uma guerra na Sonífera Ilha.  Os comentários viraram uma baixaria sem fim, ambos os lados perderam a linha, isso é fato.

A postagem se multiplicou rapidamente pela internet. E na mesma velocidade, começaram a aparecer prints de homofobia relacionados a  alguns amigos dele , que ali fizeram comentários dignos de cadeia em qualquer país civilizado. Aqui, por enquanto, dá apenas uma multa em dinheiro, como no episódio do bar no Gonzaga, que teve que pagar multa ao casal vitima de homofobia em 2014 e foi noticia nacional.

As pessoas ficaram tão iradas, que foram vasculhar a vida de um a um pra saber quem são esses que ajudam a propagar o ódio aos homossexuais. Gays, artistas, simpatizantes e gente que eu nunca vi na minha vida me enviaram mensagens e manifestaram sua indignação nas redes sociais. Só se fala nisso nos últimos dias.

Vou por o print do post, de uma parte dos comentários, pra que algum dos meus três leitores tire suas próprias conclusões a respeito, ok? Pois não existe uma só verdade então cada um, acredita na sua.

homofobia sandro

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Na terça pela manha, recebo uma mensagem INBOX do Sandro, se desculpando pelo post, e afirmando não ser homofóbico e que havia sido interpretado erroneamente. Eu, que não sou Deus, aceitei suas desculpas, e avisei que escreveria este post.

Quem me conhece sabe que não é uma questão pessoal, mas sim ideológica.

Lutei a vida toda pra ser diferente, fui convidado a me retirar de casa e excluído da família por ser gay, meu trabalho em teatro há algum tempo, tem uma pesquisa com foco na população LGBT, embora seja feito para todos os públicos. Jamais conseguiria fingir que nada disso aconteceu. Não sinto raiva do Sandro, sinto pena!

Eu me ofendi com o que li e mais ainda com os comentários. O post é tão preconceituoso quanto os comentários mais explícitos – apenas se dá de forma mais envergonhada, numa espécie de homofobia em versão light. Nos comentários, eles falavam de MORALIDADE, FAMILIA, CERTO E ERRADO, chamaram-nos de veadinhos, disseram que devemos morrer e coisas do tipo.

Pra que tanto ódio? Que mal há em se aceitar? Santos, cidade linda, maravilhosa, pra se viver, não e assim aquela musiquinha? Mas na real, nao é bem assim…

A atitude homofóbica, em geral, vem acompanhada pela frase ‘não tenho nada contra, mas… ’. Geralmente, há um discurso fundamentalista religioso, de forte apelo “moral”. Vale lembrar que homofóbicos tem um mantra e adoram repeti-lo: “Eu não sou homofóbico”.  Costumamos repelir as pessoas porque enxergamos nelas, coisas que reconhecemos em nos,  mas que nao sabemos lidar, nao e verdade?

Publiquei aqui uma vez que Santos, e uma cidade extremamente homofóbica e fui questionado por um leitor, nos comentários, em que dados eu me baseava para afirmar isso. Na época, publiquei os dados do GGB (Grupo Gay da Bahia), mas também vale lembrar que, só quem sente na pele, pode afirmar algo assim com tanta convicção. Não vou ficar contando meus perrecos aqui, não há necessidade disso. Quem é assumido sabe de todas as dificuldades e já sentiu o preconceito, mesmo que velado, na pele.

Já tinha visto algumas piadas relacionadas aos gays na página dele, porém nenhuma delas havia me ofendido até então. Vivemos um momento de visibilidade para a população LGBT, e talvez a Globo tenha entendido que normatizar relações homo afetivas, seja o melhor caminho pra eliminar o preconceito.

Talvez a Globo só esteja de olho no Pink Money e da audiência desta população que cresce a cada dia.

Mesmo assim, ainda acho uma atitude louvável, com todas as bitocas e beijos mal dados.

O que eu não entendo, e nunca vou entender, por que dessa galera se preocupar tanto com a vida alheia? Porque o amor entre pessoas do mesmo sexo incomoda tanto? Não e melhor sair do armário e viver de modo pleno, ao invés de casar, ter filhos e se arrastar como um pobre diabo degenerado atrás de sexo com outros homens? Já cansei de falar que Santos, é a cidade do homem casado que leva vida dupla. Se conseguíssemos realizar um senso, tenho certeza de que essa população de enrustidos será maior do que a LGBT com todos os seus gêneros e subgêneros. Mas isso é praticamente impossível, já que todos vivem escondidos atrás das telas de seus computadores. As pessoas deveriam aprender a escrever, antes de fiscalizar o cu alheio ne? Como diz meu amigo Junior Texaco: “Quem goza gostoso, nao se preocupa com a foda alheia”

Desde terça-feira, recebo mensagens constantes do Sandro, ele me pediu desculpas várias vezes e tem se mostrado disposto a reparar seu erro. Ele também tem procurado algumas pessoas pra se desculpar, pessoalmente, ou pela internet. Mas a galera está muito magoada e acho que essa ferida demora um tempo pra cicatrizar.

Obviamente, dei espaço para que ele pudesse se retratar publicamente. Eu não sou melhor que ele e acho que todo mundo tem direito de errar. Se eu luto pela IGUALDADE de direitos, não seria justo não deixa-lo se justificar.

Não acredito que uma guerra resolva essas questões. Não quero impor nada a ninguém, quero apenas ser respeitado e não ser tratado como uma aberração. Quero apenas, poder ir e vir, direito assegurado pela constituição a todos, sem ouvir piadinhas de pessoas que se acham superiores e nos tratam como a escória.

Acredito que as pessoas podem se adaptar aos novos tempos, mas elas não mudam de verdade, minha trajetória de vida me ensinou isso. Mas espero que esse episódio, tenha servido de lição para ele e seus amigos. A população LGBT não esta para brincadeira e estamos atentos a este tipo de comportamento que só incentiva essa quantidade absurda de crimes de ódio contra os gays.

Fica aqui um vídeo do Dr. Dráuzio Varella, enviado por uma amiga via facebook hoje, de lição de casa pra quem tem esse tipo de comportamento:

[ytplayer video=”https://www.youtube.com/embed/rqi-UTb9f9Y”]

Sandro, como lhe disse, suas desculpas estão aceitas, de coração. Creio que isso já ficou claro em nossas conversas nos últimos dias. Acredito que você esteja mal com isso tudo. Que a sexualidade alheia, não seja algo importante e nem motivo de piadas infelizes. Que possamos viver em harmonia na mesma cidade, sem termos que demarcar território. Esse episodio infeliz, te fez perder amigos, te tirou o sono e deu a real dimensão do que e ser vitima de preconceito, ser alvo de piadas diariamente, ser ridicularizado, perseguido. Como lhe disse, nossas vidas giram em torno das redes sociais hoje em dia, pense antes de fazer um comentário, se você não ira machucar alguém e se isso não lhe trará uma dor de cabeça como esta. Torço, sinceramente, pra que a partir de agora, você tenha a capacidade de se colocar no lugar do outro, no caso os gays, e que  junte-se a nos, na luta contra a homofobia, por uma sociedade mais igualitaria e menos hipocrita,  para que a próxima geração, a geração das suas filhas, viva em um mundo onde as diferenças são respeitadas. Sexualidade não define caráter, atitudes sim!

 

Abaixo, o pedido oficial de desculpas dele.

“Venho por meio desta, em resposta as postagens feitas contra minha pessoa, esclarecer alguns fatos.

Primeiramente, importante ressaltar que a postagem por mim postada em rede social e publicada pelo Luiz aqui neste espaço, não teve, em momento algum, a intenção de denegrir, ofender, humilhar ou descriminar, qualquer pessoa.

Fiz a postagem como único intuito de comentar a repetição de um mesmo tema na novela, sem que tal comentário tivesse a intenção de ofender qualquer pessoa e, diante da repercussão negativa, resolvi excluir a
publicação.
Tenho grande respeito pela comunidade LGBT e, por conta disso, após os comentários ofensivos recebidos, percebi que minha postagem foi  erroneamente interpretada.
Todas as pessoas que me conhecem de fato sabem que jamais apresentei qualquer reação discriminatória, seja por qual motivo for. Pauto minha vida pelo respeito e honestidade, mas, principalmente amor ao próximo.
Tenho 3 filhas pequenas, diante disso procuro educa-las para que sejam respeitosas e, principalmente, que busquem sempre a felicidade.
Assim, agradecendo desde já o espaço oferecido por este blog, e manifesto publicamente minhas sinceras desculpas pela postagem que causou tanto mal estar e indignação.
Para finalizar, agradeço de coração a ajuda e o esclarecimento do Luiz Fernando. Sei que a causa é justa, e o caminho é longo, mas acreditem, sempre estarei ao lado de todos que buscam uma sociedade justa e livre de qualquer preconceito.”
Atenciosamente,
SANDRO VALENTE