Texto porLeandro Marçal
Escritor e jornalista, Santos - SP
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Parabéns pra mim

Queridos seguidores dessa rede social, posto essa foto com um textão que pouquíssimos terão paciência para ler até o final com o nobre intuito de avisá-los que hoje é meu aniversário. Sei que no cantinho da tela há um lembrete, mas não custa ressaltar.

Evidentemente, nada melhor que um ângulo favorável, depois de dezenas de fotos excluídas no arquivo do celular. Pode ser uma selfie diante da paisagem montanhosa ou litorânea, ou mesmo a deliciosa falsa foto espontânea, como modelo em revista de moda. Serve até o retrato de um momento que só faz sentido para mim. Isso é o de menos, o importante é alimentar minha vaidade incontida.

www.juicysantos.com.br - parabéns para mim, uma crônica de leandro marçal

Nos dias sem redes sociais, apenas meus parentes mais próximos ligavam ou passavam em casa. Era uma lembrança espontânea. A vantagem dessa gigante aldeia digital é não haver desculpas para esquecimentos, viciados na máquina de fazer bilhões daquele norteamericano megalomaníaco comprador de concorrentes.

Devo passar o restante do dia com falsa emoção e surpresa, dando amei nos comentários deste registro narcisista, depois agradecendo um a um, mesmo aqueles com os quais não tenho a menor intimidade, pedindo presentes como mensagem subliminar aos flertes. O importante é a autolouvação.

Aliás, é notável minha disposição para esse texto gigante como legenda, agradecendo a Deus por tudo que conquistei e pelas superações quaisquer em tom de autoajuda. Tais obstáculos nem sei se existem, mas preciso praticar a masturbação virtual.

Sei que, para além das convenções sociais, ninguém liga muito. Mas, me sinto na obrigação de me atribuir uma importância muito maior que a real. Por aqui, podemos falar de tudo e de todos, até de nós mesmos. Se alguém me chama de egocêntrico, respondo que está no lugar errado, peço para sair do umbiguismo das redes.

Por mais que não haja o menor sentido nos “parabéns pra mim”, jamais fugiria à regra. Nos últimos meses, fiz contagem regressiva e meus amigos compartilharam fotos constrangedoras em postagens supostamente bem-humoradas. Só para lembrar dos meus 15 minutos de fama na minha bolha. Em um futuro não muito distante, as pessoas vão suplicar por 15 minutos de anonimato.

Enquanto esse futuro não chega, encho as telas com essa ego trip desnecessária, mas prevista. O resto é pura chatice. Se me ironizam, dizendo que o mundo não gira ao meu redor. Acuso frustrações, inveja e outros sentimentos que fingimos desconhecer.

Amanhã, vou reviver meu aniversário com uma postagem de agradecimento por todas as felicitações nos diversos meios de comunicação, ainda que pouquíssimas tenham acontecido fora dessa rede social.

Pouco importa. Vou aproveitar o meu dia, curtindo, comentando, fingindo chorar. Estou aqui para isso.