Taiane Myiake, um exemplo de vitória!

Voltei, gentchy!

Apos um longo período resolvendo minha vida, volto a escrever ,semanalmente,  no blog mais amado de Santos. Então, meus três leitores, chega de saudade!

Mas vamos ao que interessa? Vamos falar de Taiane Myiake!

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Eu conheço a Taiane desde a nossa adolescência. Ela estava em processo de transformação e era muito tímida, falava pouco, mas sempre extremamente educada e inteligente. Não eramos amigos, nos encontrávamos a noite, nas boates ou na praia, quando o Boqueirão ainda era o ponto de encontro dos gays, lá no inicio da década de 90.

Fui embora de Santos e quando voltei e a reencontrei, linda, com seios e super engajada, fiquei muito feliz em ver que tudo tinha dado certo. Sou fã incondicional pelo simples fato de Taiane ser um exemplo não só para a população trans, mas para toda a sociedade de que é possível vencer e seguir em frente.

Taiane atualmente coordena a Comissão Municipal da Diversidade Sexual de Santos, empreendendo ações de inclusão para a população LGBT, repensando e atuando na efetiva mobilização na luta contra a discriminação em função de identidade de gênero e orientação sexual.

Além disso, integra a Comissão da Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo e de Gênero da OAB Santos e OAB São Paulo, representante da Baixada Santista no Fórum Paulista de Travestis e Transexuais, Agente de Prevenção Voluntária atuando em campo com ações de prevenção e sensibilização contra doenças sexualmente transmissíveis. Ufa! Um curriculum de fazer inveja a muita gente.

Tainae Myiake hoje é a grande referência na Baixada Santista quando falamos na população trans, não só por seu empenho e dedicação, mas também por sua linda história de vida.

Batemos um papo e conversamos sobre vida pessoal, militância, cena LGBT na Baixada, que você lê a seguir:

Quando você começou na militância LGBT e por quê?

Sofri preconceito dentro do próprio meio LGBT, mais precisamente com as travestis, naquela ocasião, Travesti na concepção delas, só era Travesti se tivesse na construção do seu corpo silicone industrial, Eu desde o inicio optei pela Hormonioterapia, comecei tomando o que me indicavam (“aszamigas” eram ótimas para indicações) e com isso tive reações alérgicas absurdas, conheci um médico que se predispôs a me dar um receituário para que Eu pudesse comprar hormônios na farmácia, mesmo assim o afastamento delas comigo era gritante, pelo fato deu nunca ter sentido a dor do óleo (silicone industrial).

Naquela ocasião já militava sem saber, como sempre tive minha mãe do lado, eu incentivava as meninas a irem a lojas femininas comprarem suas roupas, seus acessórios, seus sapatos, aquelas que só viviam o glamour da noite, com roupas de festas passaram a conhecer o dia também, e aí surgiu uma nova geração de travestis, as ninfetinhas que usavam calças jeans e blusinhas ciganinhas, Você lembra bem disso (rs). O tempo foi passando, as matriarcas da noite que não aceitavam muito as novatas foram morrendo e um novo cenário trans surge, a hipocrisia continua e as diferenças também dentro do nossos meio, muitos egos e vaidades falam mais alto.

Conheci a ONG AVE Associação Vida e Esperança em São Vicente, o trabalho deles era direcionado a população LGBT e sempre gostei de trabalhar com direitos humanos e principalmente pelas minorias, trabalhei nos governos Telma de Souza, Capistrano e início do governo Beto Mansur na Prefeitura de Santos, era Educador de Rua, com população de rua, menores drogaditos, pessoas em situação de prostituição e isso me encantou, pensei é isso que Eu quero fazer, só um detalhe, Eu trabalhava com uma faixa amarrada prá esconder os seios.

Vivi um grande amor por 12 anos, nesta época me afastei dessa militância informal, terminamos o relacionamento, perdi a minha mãe na mesma ocasião e prá espairecer e por influência de uma amiga que também havia perdido o namorado, resolvi voltar à cena da militância com Ela, por intermédio dessa mesma amiga, participei de um processo seletivo para Agente de Prevenção Voluntária, isso em 2012, passei nessa seleção e de lá prá cá não parei mais, conciliei o trabalho de Agente com a Militância.

Você foi Coordenadora da comissão da diversidade sexual de Santos este ano, quais são seus objetivos a frente desta pasta?

Estou Coordenadora desta Comissão, é tudo muito recente, fui eleita por aclamação no dia 27 de agosto passado, na 1ª gestão estive Vice Coordenadora.

A Comissão Municipal de Diversidade Sexual – CMDS foi criada pelo decreto nº6. 412 de 17 de maio de 2013, ela é composta por Sociedade Civil e Secretarias do poder público deste município, Ela é vinculada administrativamente a Secretaria de Defesa e da Cidadania. Esta CMDS tem caráter deliberativo, normativo, fiscalizador das ações governamentais e não governamentais relativas à população LGBT de Santos, tem a finalidade de elaborar, estudar, assessorar, emitir pareceres, analisar e propor politicas públicas em prol da comunidade no âmbito municipal.

Tenho muitas ideias, porém enquanto sociedade civil que sou, estou limitada, prá quase tudo que tenho intenção de realizar, dependo do poder público e nem sempre consigo realizar por questões burocráticas, mas posso dizer que hoje temos um Secretário que é acessível, tem um olhar diferenciado para o segmento e quando não tem condições de oferecer aquilo que eu peço, sempre tem alternativa. Sendo muito franca, às vezes Eu surto, sou chata, cobro, mas também sei entender e acatar quando não se tem condições de fazer, a Secretaria de Defesa e da Cidadania é tão importante pros direitos humanos, porém é uma secretaria pobre, tem as suas limitações. Pra quase todos os eventos que esta CMDS realiza, precisamos de parceria de outras secretarias para realizá-los e é outra limitação que esbarro infelizmente esta Comissão não tem uma dotação orçamentária especifica. E também é uma coisa que pretendo cutucar e ver quais os caminhos a percorrer prá que um dia esta CMDS tenha uma dotação especifica.

Meu principal objetivo é que esta Comissão futuramente seja um Conselho, mas prá que isso aconteça, preciso ter uma Comissão fortalecida e isso é outro problema, tenho nas reuniões presenciais a participação maior das secretarias (poder público) e a população LGBT que deveria ocupar aquele espaço, porque o espaço é nosso, não comparece, então fica difícil às vezes convencer o poder público sobre algo importante prá este segmento se o próprio não está presente, Eu pensava e ainda penso que comigo na Coordenação, sendo sociedade civil, militante e ativista que Sou, a cena mudaria, teríamos mais pessoas LGBT, mas isso ainda não aconteceu, mas não perco minha fé.

Tenho por obrigação trabalhar em prol de todo segmento LGBT, mas prá que isso se concretize em ações efetivas, preciso que os LGB venham a Mim, tragam suas demandas, suas ideias, seus projetos prá juntos colocarmos em prática.

Sou travesti e defendo segmento de travestis, mulheres transexuais e homens trans com unhas e dentes, enquanto Eu estiver nesta CMDS vou atrás de políticas públicas sim prá essas pessoas, tenho intenção de entrar no Sistema Prisional, vai ser difícil, vai, mas vou tentar, preciso saber como vivem essas pessoas lá dentro, como são assistidas e isso todo segmento LGBT está envolvido, mas é pouco, existem outras demandas e preciso de pessoas me ajudando e essas pessoas tem que ser LGBT porque são elas que passam as dificuldades e não os representantes de secretarias.

Que ações efetivas a prefeitura tem realizado junto à população LGBT?

Em janeiro deste ano foi sancionado a lei do Nome social para Travestis, mulheres transexuais e homens trans. deste município, o propositor desta lei foi o Vereador Prof. Igor, mas também não posso deixar de mencionar que em outra gestão o Ex Vereador Arlindo Barros já tinha apresentado este decreto a Câmara, não foi fácil isso se realizar e a CMDS teve papel fundamental nesta ação, porque a Câmara votou contra o que de inicio era um decreto, ocupei a tribuna cidadã na Câmara dos Vereadores e numa fala de sensibilização, cobrei deles (Vereadores) com que direito Eles achavam inconstitucional o respeito ao nome social prá essas pessoas. O Sr Prefeito encaminhou este decreto a CMDS e juntos Eu, SR Nicola Margiota Junior, Dra Rosangela Novaes e Dra Patrícia Gorish elaboramos outro documento em cima do decreto proposto pelo Vereador Prof. Igor dando outro parecer, mais jurídico e também da sua importância (nome social). Foi elaborado prá ser decreto, passou a ser Projeto de lei, foi em votação em novembro do ano passado e teve um voto contra e uma abstenção.

Hoje temos funcionando no Hospital Guilherme Álvaro, o ambulatório de saúde integral para travestis e transexuais, nos moldes do programa do Processo Transexualizador do SUS, também muito me orgulha, porque na 1ª reunião que estive com Dr Ricardo Hayden, diretor do hospital Guilherme Álvaro e expliquei a Ele a importância deste ambulatório prá Baixada Santista, Ele aceitou na hora bancar esse projeto, não me perguntou sobre Demandas e aproveito para mencionar também a Sra. Regina Lacerda, que é a coordenadora do Programa de DST/AIDS e Hepatites de Santos, que foi quem viabilizou este meu contato com o Dr Ricardo Hayden, a quem sou muito grata.  Houve várias parcerias neste projeto e com isso a CMDS também se faz presente.

A CMDS pediu ao secretário de Defesa e da Cidadania uma Coordenadoria LGBT, não existe em Santos um equipamento referência às pessoas LGBT, como já disse é uma secretaria sem muitos recursos e o que nos foi prometido pelo Sr Secretário Carlos Mota uma Secção da Diversidade, a própria CMDS fez a indicação de um nome prá assumir esta secção, as negociações já estão acontecendo e em breve a teremos funcionando.

Além de termos também outras datas comemorativas ao segmento LGBT, está no calendário municipal a Semana da Diversidade Sexual que é realizada sempre na última semana de novembro, este ano de 23 a 28 de novembro/2015, é uma semana de várias atividades em vários espaços, tanto pro segmento LGBT quanto pra sociedade em geral, também estamos na construção desta semana e em breve posso passar a grade de eventos.

Existe algum tipo de programa de capacitação voltado a pessoas Trans em nossa região?

Infelizmente não. O que a prefeitura oferece são cursos, posso citar, corte e costura profissionais em beleza, manicure e pedicuro, panificação, artesanatos e outros. Cursos, abertos as quaisquer pessoas independente da sua identidade de gênero, já tivemos travestis, mulheres transexuais e homens trans participando desses cursos juntamente com outras pessoas, não há um segregamento de pessoas, a intenção é justamente a inclusão e já assisti de perto isso, dá muito certo, mas a procura ainda é muito pequena, a maioria das travestis e mulheres transexuais que temos em Santos ainda estão na prostituição, fica difícil pra Elas participarem de cursos durante o dia quando a noite elas estão em atividades e o dia é para dormir.

Eu penso que esses cursos, tem que ser incentivado a essas pessoas quando elas se descobrem travestis, mulheres transexuais e homens trans porque uma vez que ela/ele se evade da escola, é colocada (o) na rua, quem vai acolher esta pessoa é alguém da rua e a rua só tem a oferecer a prostituição.

A escola é fator fundamental pra que uma travesti, mulher transexual não caia nas esquinas, uma vez que ela se evade da escola, ela rompe com a sociedade cisnormativa e com tudo que já vimos acontecer com as outras, elas passam a pensar, “vou ser mais uma excluída”, mesmo com diploma é difícil à empregabilidade para essas pessoas, ainda existe preconceito, não vemos Travestis a frente de um caixa de supermercado, não vemos travestis a frente de uma loja, que dirá sem diploma. Temos em Santos duas empresas que empregam Travestis e Transexuais respeitando nome social e sua identidade de gênero, porém são empresas de telemarketing, não é o ideal, ainda temos travestis e transexuais escondidas atrás de um telefone, mas ao menos é uma opção, assim como a prostituição deveria também ser uma opção e não uma obrigatoriedade. A impressão que tenho é que prá sociedade nascemos e trazemos no DNA sermos prostitutas, mas ninguém nunca parou numa esquina e perguntou prá uma dessas meninas se Ela tivesse outra oportunidade, ainda estaria ali. Já os homens Trans a dificuldade é ainda maior porque Ele não tem como ir pra prostituição, é muito complicado.

Precisamos discutir dentro das escolas as diferenças e sensibilizar a sociedade para que nos veja com outros olhos.

Você também trabalha como agente de saúde, sensibilizando as meninas que trabalham nas ruas, como e esse trabalho e a receptividade delas?

Ser Agente de Prevenção Voluntária, sempre friso o Voluntária, mesmo tendo uma ajuda de custo, mas é assim que a Secretaria sempre nos enfatiza que somos Voluntárias, logo nossos direitos são limitados.

Mas ser, APV, é o que me faz a cada dia ter ideias novas pra melhoria dessa população tão judiada, tão excluída, tão estigmatizada, a qual eu também faço parte mesmo sendo uma Agente de Prevenção Voluntária.

O nosso trabalho (somos uma equipe) é tão significativo e nada reconhecido, através da entrega do preservativo e do gel lubrificante é que estabelecemos um vinculo com as meninas, a grande maioria já nos conhece, somos chamadas de saúde, a fada das camisinhas, sempre somos recebidas com alegria porque Elas também sabem da importância daqueles insumos na vida sexual delas, hoje nosso trabalho além das ruas que passou a ser um Plus, atendemos as residências, onde podemos ter um melhor diálogo, é o momento que elas estão acordando e às vezes já se arrumando prá sair prá rua, nas ruas é tudo muito rápido porque elas estão em transito à espera de clientes e às vezes atrapalhamos, mas mesmo na rua a receptividade é ótima, só não temos muito tempo para outros esclarecimentos. E quando abastecemos nas casas, Elas já vão prá rua munida dos insumos (preservativo e gel). Também fazemos encaminhamentos quando nos são pedido (por Elas) para as ubs, pronto socorros, CTA, CRT e outras redes.

Quem sabe um dia a nossa Secretaria de Saúde reconheça nosso trabalho e nos insira neste município como Agentes de Saúde e de Prevenção #ficadica Sr Marcos Calvo, Secretário de Saúde, que isso chegue até Ele.

Como você vê a cena LGBT na Baixada Santista atualmente?

A cena é tão hipócrita quanto a sociedade, não temos movimentos sociais fomentando o segmento como vemos em outras partes do país, sei bem o quão é difícil se assumir gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, neste país, e na BS é mais complicado ainda, mas hoje temos alguns decretos e leis que nos amparam e mesmo assim ainda temos resistência dessa população, por questões familiares, de trabalho, de religião e outras, é compreensível sim, mas será que esses resistentes são a maioria? A resistência maior é sair às ruas pra uma Caminhada LGBT, já fizemos duas caminhadas aqui, a maioria das pessoas era simpatizante heterossexual, então fica-se difícil pensar um dia termos uma Parada LGBT em Santos, e já tivemos em outros anos em São Vicente, Guarujá, Bertioga e foi super apreciado e aceito, mas vejo Santos um tanto longe disso.

Outra coisa, para se fazer politicas públicas pra população LGBT faz-se preciso ter pessoas LGBT nos espaços de discussão e não temos, são sempre as mesmas pessoas, já levaram criticas a Secretaria de Defesa e da cidadania que a CMDS só tem ações efetivas “pras” travestis e transexuais e as outras letras? Nunca exclui nenhuma letra do segmento, e jamais farei isso, meu trabalho é pro coletivo, mas para que possamos ter ações efetivas preciso da presença dessas pessoas para juntos construirmos essas politicas, não conheço as demandas das outras letras “LGB” em todos os espaços que vou palestrar, digo: Nós travestis e transexuais somos protagonistas das nossas ações, quantas ONGs já tivemos aqui em Santos e na baixada e quantas dessas fizeram algo prá Nós Travestis e Transexuais? Nenhuma precisou Eu gritar, chega ninguém mais vai falar pelas Travestis e Transexuais nessa Baixada que não seja EU, e ninguém contrapôs, porque ninguém nunca esteve disposto a fazer algo por Nós, essa é a verdade, e depois disso as coisas começaram a sair do papel, mas através de Mim.

Também vejo uma nova geração LGBT alienada na BS, que só pensam em boates, open bar, afters tudo muito superficial, as drogas, as DSTs, a AIDS aumentando e não tenho braços nem condições pra trazer essas pessoas prá outra realidade. E se não formos Nós LGBTs arregaçar as mangas e partir prá ação, ninguém vai fazer nada, porque para o poder público se mexer, faz-se necessário ter uma demanda especifica e se essa demanda está invisível, nada é feito. É muito triste.

Transexuais agora podem usar o nome social em repartições publicas aqui em Santos. Isso esta funcionando bem?

Quando temos em nossa Constituição lá em 1988, art. 5º, que diz que todos e todas somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza e blá, blá, blá, e não funciona e em 2010 temos um decreto de Lei do estado de SP que fica segurado o uso e o respeito ao nome social para as travestis, mulheres transexuais e homens trans e também não é respeitado neste município, por partes dos órgãos públicos, Eu mesma politizada que Sou, com cartão SUS com nome social, outro direito que nos é garantido, tive problemas com relação ao não respeito ao meu nome social em UBS deste município, fico P da vida e daí vou atrás deste decreto prá que Santos esteja na vanguarda e prá que a minha população de Travestis, mulheres transexuais e homens trans estejam inseridas nessa Santos que o Prefeito Paulo Alexandre Barbosa dizia em sua campanha “Uma Santos para todos”, que até então Eu não me sentia inserida. A lei como já mencionei foi sancionada em janeiro deste ano e por si só já deveria ser respeitada, mas na prática não é assim que funciona, estamos hoje dando capacitação aos servidores, estou sempre junto dando depoimento do quão é importante que sejamos respeitadas pelo nosso nome, enfatizo sempre que o servidor que não respeitar essa lei vai sofrer penas por parte do Poder Público, a intenção é que essa capacitação seja feita de seis em seis meses com todas as secretarias, digo que 70% estão sendo positivo, nem tudo são flores, estamos tendo problemas com AME-Aparecida, que é do Estado, e a orientação que dou As pessoas quando não são respeitadas é que se direcionem a ouvidoria façam denúncias e me levem na CMDS para que eu possa tomar outras providências.

Estamos caminhando para uma Santos mais inclusiva, devagarinho, passos de formiguinha, mas com isso travestis, mulheres transexuais e homens trans passam a frequentar os serviços de saúde e esse era meu objetivo maior, ter essas pessoas sendo atendidas dignamente, muitas dessas pessoas nunca pisaram numa UBS por vergonha, por saber que não seriam respeitadas, haja vista que hoje no ambulatório de saúde integral para travestis e transexuais é uma festa, as acompanhadas (os) tem grupos de interação, se encontram fins de semana, e isso me emociona sabe, claro que a sociedade precisa melhorar muito prá que Nós sejamos aceitas (os), mas acho que algumas coisas já estão mudando, enquanto Eu estiver à frente ninguém vou brigar para que os nossos direitos sejam respeitados .

Como você lida com o preconceito?

No inicio me preocupei muito com preconceito das pessoas, mas sempre tive ao meu lado uma Mãe que sempre me orientou meu 1º salto alto, foi dado por Ela dentro de uma loja, shopping Miramar, Ela me fez calçar, Eu morrendo de vergonha, me levantar do banco, eu trêmula, cor do rosto fúcsia porque vermelho é pra fraquinhas (rs), loja cheia e disse anda agora, dei dois passos e sentei, Ela disse, é isso que você vai passar diariamente, é isso que você quer prá você? As pessoas nunca irão ti olhar com olhos normais, mas se for isso que você quer prá você, estarei do seu lado pro que der e vier e assim foi até os últimos dias dela. Eu saia com amigas montada de casa e Ela saia atrás escondida prá ver se iria mexer com a gente, soube disso tempos depois e tendo Ela como minha mola propulsora nunca tive medo de nada e abstive o preconceito, vou onde quero, tenho direito de ir e vir, nunca fui impedida de usar banheiro feminino, nunca sofri violência e peço a Deus que continue assim.

Santos sempre foi uma cidade hipócrita quando o assunto e sexualidade. Você acha que a aceitação melhorou em nossa região?

Então, sou Travesti, hoje, sou a referência desse segmento na Baixada Santista, adentro todos os órgãos públicos deste e de outros municípios, sou temida por uns, bem recebida por outros, me fiz dar o respeito e com isso sou respeitada e agora a frente da Coordenação da CMDS mais ainda, ninguém toma uma decisão a revelia sem 1º vim dialogar comigo, não permito isso e quando acontece vou atrás prá saber com que propriedade e com que legitimidade se tem a tomar qualquer iniciativa prá população LGBT sem antes me comunicar, é abuso de poder é sim, mas alguém tem que moralizar e se fazer ser respeitada. Se um dia foi bagunça, hoje não é mais.

Apesar dos avanços, a sexualidade ainda é um assunto tabu e aqui em Santos não é diferente, Santos é vista como a cidade dos idosos, alguns ainda tem aquela mentalidade de tempos atrás, sexo no escuro, tudo muito acobertado, nem se falava, mas com o surgimento do Viagra desmistificou-se um pouco isso, conheço idosos com idades avançadas que tem uma vida sexual ativa, percebo idosos hoje com uma mentalidade em relação à sexualidade melhor que as ditas pessoas novas, eles entendem melhor a travestilidade e a transexualidade que muitos novos.

Se você for ao Centro de Santos à noite, a maioria dos clientes que procuram Travestis e mulheres transexuais são de classe média alta, automóveis variados, muitos engravatados, pais de famílias, mas que em suas rodinhas de amigos falam mal dessas pessoas.

Ainda vejo Santos, uma cidade hipócrita, porém existe certo respeito por parte dessas pessoas, porque os avanços políticos em favor dos nossos direitos estão acontecendo. Não podemos estagnar, precisamos mais e mais avançar nas politicas públicas para pessoas LGBT, somente assim teremos nosso território marcado e respeitado.

Ocorrem muitos crimes de ódio com trans aqui em Santos?

Desconheço crimes de ódios em Santos, não tenho conhecimento, já soube em São Vicente e também Cubatão, mas também morrem com essas pessoas, 1º porque não temos uma Lei contra o Homolesbotransfobia e 2º porque não temos movimentos sociais, nem ONGs que vão atrás de pedir aos órgãos da segurança pública que esses crimes sejam vistos com mais carinho (falando em metáforas). O que muito acontece em Santos é quando um cliente não quer pagar o programa e isso não acontece somente no segmento de travestis e mulheres transexuais, mulheres cis (biológicas) também, elas quebram o pau, porque querem receber pelos serviços prestados e o espertinho (cliente) leva o caso a policia dizendo que está sendo subornado, sofreu violência, quando não diz que confundiu a Travesti com Mulher sendo que na Rua Amador Bueno, Martim Afonso e adjacências somente travestis e mulheres transexuais fazem ponto e claro que a policia vai ouvir aquele que se diz ser a vítima (cliente) do que a travesti ou a mulher, nesses casos vão presas e sob fiança são soltas.

Deixe um recado para os leitores do Juicy Santos.

Agradeço a oportunidade de estar aqui relatando a minha vivência, a minha recente experiência enquanto Coordenadora da CMDS e as dificuldades diárias que sofremos, em momento algum quero passar nessa entrevista que somos pessoas vitimadas, que temos a todo custo sermos aceitas (os) e que com isso queremos privilégios, o que queremos, é apenas dignidade e respeito.

E deixo uma reflexão em forma de provocação: nós, Travestis e Mulheres Transexuais, também temos o direito a viver numa sociedade mais justa e igualitária e não somos somente um pedaço de carne nas esquinas.

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(a parte da entrevistada:  reparem que eu ja acuendava a neca!) <3

NÃO POSSO deixar de lembrar que no domingo acontece mais uma ediçao da MAGIC SPACE, lá na The Club (me recuso a chamar de internacional), O Raphael Luiz, preparou uma festa com o tema “Toys” e já roeu todas as unhas de ansiedade. O line up esta pra lá de matador. Infos aqui.