Texto porLudmilla Rossi
Santos
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Tartarugas em Santos

Nos finais de semana de sol a cena se repete: locais e turistas ficam no Emissário Submarino observando as cabecinhas das tartarugas saírem para respirar. Nesse artigo vamos falar das tartarugas que aparecem no Emissário Submarino de Santos. A espécie dessa tartaruga chama-se Chelonia mydas, que também pode ser chamada de tartaruga verde.

Quase todas as cabecinhas pra fora do mar que você verá são dessa espécie, especialmente de indivíduos jovens. Elas entram no mar de Santos por conta de um instinto milenar – justamente pela abundância de alimentos que temos aqui no estuário, que funciona como um berçário para os animais marinhos. Durante a fase jovem e antes de atingir a maturidade sexual essas tartarugas são onívoras, ou seja, comem de tudo. Na fase jovem, costumam agir de maneira bastante carnívora e tornam-se vegetarianas com a maturidade.

Outras duas espécies que também podem ser encontradas, mas não tão frequentemente são a tartaruga cabeçuda (Caretta caretta) e a tartaruga de pente (Eretmochelys imbricata). Porém, 95% dos animais que vemos aqui são tartarugas verdes, como as da foto abaixo.

Elas chegam a 1 metro e meio de comprimento e já foi encontrada por aí uma delas com mais de 350 kilos. É um animal de crescimento super lento, cuja maturidade sexual é atingida entre 20 e 50 anos. E duram entre 80 e 90 anos, tendo uma vida longa, similar à de um ser humano.

Tartarugas do Emissário Submarino de Santos

Nós causamos com as tartarugas em Santos

Essas tartarugas, animais pré-históricos que achamos lindinhas são absolutamente ferrados pela gente. Lembra que mencionei que elas comem de tudo? Esse acaba sendo um problemão: as tartarugas verdes que entram no mar de Santos acabam encontrando um buffet completo de PLÁSTICO. Não é a toa que os biólogos marinhos chamam nosso mar de sopa de plástico.

Estamos acelerando a mortalidade das Chelonia mydas por conta da quantidade de lixo doméstico que vai parar diretamente e indiretamente nos mares da região. Essas tartarugas estão consumindo o plástico que elas confundem com alimentos: sacolas plásticas, tampinhas de caneta, pinos de cocaína, pequenos fragmentos de plástico, brinquedos, entre outros. É simples entender a lógica:

  • essas tartarugas são animais pré-históricos
  • há 5 décadas atrás tudo que tinha no mar era comida
  • ou seja, elas comem indiscriminadamente porque faz parte do instinto delas
  • como são indivíduos juvenis, elas correm perigo consumindo o plástico
  • e morrem antes de atingir a maturidade sexual, ou seja…

Tá fácil entender porque elas estão ameaçadas de extinção.

Por que elas morrem?

O lixo e o plástico causam problemas de curto e médio prazo para as tartarugas. Desde sufocamentos (quando elas não conseguem voltar à superfície para respirar e morrem imediatamente), emaranhamentos (que causam ferimentos e infecções), até a intoxicação e queda de imunidade por conta do acúmulo do plástico em seus organismos. Os pequenos fragmentos de plástico causam desde obstruções no trato digestório até perfurações que levam à morte.

Mas eu não jogo lixo na praia…

Você tá de parabéns e não fez mais do que a sua obrigação. Mas não é bem esse o problema.

Existe um pensamento falacioso aqui em Santos onde os locais acham que é “o turista” e “os navios” que poluem o nosso mar. E que o problema é o lixo que vemos quando caminhamos entre o canal 1 e o canal 6. Eu não sei como essas lendas se construíram na cidade – ou se elas foram verdade em algum momento da história de Santos – mas hoje o problema da poluição marinha está muito longe de ser o que se enxerga na areia.

Ação voluntária do Instituto EcofaxinaNa foto uma cena comum no estuário de Santos: lixo e mais lixo. Na foto um voluntário do Instituto Ecofaxina coleta o plástico para o descarte adequado.

É muito mais um problema ligado à desigualdade social e à um sério problema de moradia. Com o crescimento das favelas de palafita (temos uma das maiores do país), sem tratamento de esgoto e de lixo, onde você acha que está indo parar o lixo doméstico dessas comunidades?

Isso explica o pote de margarina de 1990

Lembro que uma vez estava caminhando na praia e me deparei com uma embalagem de margarina muito velha. Muito velha mesmo. Fiquei pensando quem poderia levar um potinho desses para uma farofa na praia e não tive resposta. Mas, anos depois me toquei que era lixo doméstico e não lixo recreativo.

Na ponta do iceberg temos 20 toneladas de lixo chegando diariamente em nosso litoral. E é só a ponta do iceberg, porque a maior parte do lixo permanece nas colunas d’água, nos costões rochosos, causando com a vida das tartarugas.

No Emissário Submarino, nós aproveitamos enquanto podemos vê-las

As tartarugas verdes são mais resistentes à poluição pois elas não respiram embaixo d’água. Elas precisam voltar à superfície para respirar, que é justamente quando conseguimos enxergá-las. Mas isso não significa que para elas a situação não seja de terror.

As tartarugas verdes vem sofrendo um declínio em sua população e já está na listadas como espécie em extinção. Veja bem, um animal que está aí no rolê desde a época dos dinossauros!

Chelonia Mydas no Estuário de Santos

Foto das tartarugas em Santos por Christian Fernando Silva

O que precisamos torcer é para que essas tartarugas juvenis consigam se desenvolver e atingir a maturidade sexual, onde nesta etapa as tartarugas passam a ser uma espécie de mar aberto. As tartarugas verdes que vemos aqui em Santos tem até 20 anos de idade, justamente as mais afetadas pelas altas taxas de mortalidade.

Sem falar que as tartarugas (em geral) são animais com uma baixíssima taxa de sobrevivência – a cada 100 tartarugas que nascem uma consegue chegar ao estágio juvenil. E essas pouquíssimas que conseguem entram aqui na nossa “sopa de plástico” ou ficam presas em redes de pesca e são impedidas de subir para respirar.

Ou seja, agradeça quando você ver uma tartaruga.

Nós não sabemos se as próximas gerações terão esse privilégio. 🙁

Chelonia Mydas

Foto de Christian Fernando Silva

Onde ver as tartarugas em Santos

Além do Aquário Municipal de Santos, é possível observar as tartarugas na ponta do Emissário Submarino em Santos.

Contribuíram com esse artigo Christian Fernando Silva (imagens) e William Rodriguez Schepis, biólogo marino e presidente do Instituto EcoFaxina.