King Ciclo: fenômeno santista dos anos 80
Santos, meados dos anos 1980.
A galera santista se dividia entre as noites nas baladas (alô, Zoom, Lofty e Heavy Metal) e os dias de sol e surfe.
Mas e quando as ondas não davam as caras? Aí havia duas possibilidades: encarar o horizonte ou inventar alguma coisa para fazer.
Foi em um desses dias de tédio que nasceu o King Ciclo, fenômeno santista dos anos 80.
Conhecido também como Eder de Moraes, o rei das bicicletas começou sua jornada por ser inquieto e curioso. “Eu surfava e constantemente ficava sem paciência quando não tinha onda, daí surgiu a ideia de criar uma bike com um shape em cima, tipo um skate”, lembra.
Talvez você não tenha conhecimento sobre as aventuras do cara, mas é só chamar alguém com mais idade para fazer o teste (meu pai, por exemplo, sabia até o nome e o local em que ele costumava ficar). E não tinha como ser diferente, o cara ganhou repercussão internacional e se tornou presença obrigatória nos eventos da cidade.
“Depois que apareci no Fantástico e um programa de fora veio gravar minhas aventuras, os santistas passaram a dar valor ao que eu fazia. Começaram a me convidar para todo tipo de evento, desde desfiles de escola de samba até lançamento de coleções de moda”.
Compasso
Para entender melhor como funciona a bicicleta, é só imaginar um compasso. Cada pneu seria uma ponta: quanto mais aberto, maior a circunferência, certo?
Pensando assim, com os conhecimentos obtidos através da observação dos equipamentos usados em circos e assistindo a alguns vídeos, Eder deu vida à bike. Com rodas mais próximas, ela é capaz de fazer manobras como a do vídeo.
“Ela foi feita por mim com a ajuda de bicicleteiros da cidade”, lembra Eder. “Quando comecei era visto como marginal. Naquela época, quem usava brinco e roupa rosa era gay, tatuagem e ouvir música nacional nem pensar. Eu curtia tudo isso, então, no início, as pessoas estranharam”.
Quem tem medo de altura vai se questionar: como ele conseguia fazer esse tipo de coisa???
Para isso, o rei das bikes cita a música do Pato Fu para explicar: às vezes é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo.
“Eram poucos segundo de medo que vinham quando eu não estava concentrado ou quando algum pensamento negativo invadia a minha mente. No geral, eu sabia que estava seguro, confiava no equipamento”.
Atualmente
Tempos depois, a surf bike foi encostada num canto da garagem e o Eder abiu um salão para cortar cabelos, no Gonzaga. Mas o tédio bateu novamente e ele voltou a se aventurar com a sua invenção.
“Faço parte do grupo (de teatro) Rudá, nós temos apoio da lei de incentivo a cultura e graças à ela conseguimos viajar o Brasil com um espetáculo”. O roteiro apresenta brincadeiras antigas e esquecidas para as crianças, com músicas atuais e uma iluminação que desperta o interesse da molecadinha.
Durante as constantes viagens, Eder consegue observar bem a juventude de hoje: “São privilegiados, pois podem fazer o que querem sem medo. Mas, apesar disso, é uma turma massificada, com o mesmo estilo e opiniões”.
Quando questionado sobre a possibilidade de comercializar sua invenção, o aventureiro santista mostra responsabilidade. “Já tive propostas, mas não é algo simples. Em um skate, você está a 12cm do chão, na bicicleta é praticamente 1 metro. E, aliado à velocidade, isso pode causar acidentes graves”.