Como surgiu o hábito de ir à praia para o lazer? A gente te conta
Verão bombando, temperaturas lá em cima, cerveja geladíssima no cooler e as praias do litoral de São Paulo (e as de todo o litoral brasileiro, na verdade!) estão repletas de gente buscando um lugar ao sol. E, vamos combinar, pra quem escolhe morar na Baixada Santista isso até faz parte da rotina o ano todo…
Mas você sabia que o hábito de estar perto do mar não surgiu por diversão, e sim por orientações médicas?
Sim, ir à praia era considerada uma atitude “pouco civilizada” e condenada pelas classes sociais mais privilegiadas.
Circa anos 1920/crédito: Lembranças de SP/Memória Santista
Dá pra imaginar?
É bem louco imaginar que as pessoas olhassem para aquele oceano em frente a elas e não pensassem em tomar um banho refrescante nos dias quentes, mesmo com toda aquela água ali tão próxima. No entanto, isso era perfeitamente normal até meados do século XVIII.
Até então, ninguém frequentava a praia por lazer, mesmo quem morava nas cidades litorâneas, como era o caso de Santos e territórios próximos. Isso porque apreciar a praia era visto como algo não civilizado pelos europeus, especialmente pela elite econômica. Para esse grupo, a prática estava completamente fora dos padrões sociais.
Água salgada cura
No entanto, essa ideia começou a mudar quando o renomado médico inglês John Floyer apresentou estudos destacando os efeitos medicinais da água salgada, como a do Canal da Mancha. Ou seja, todo mundo pirou nesse santo remédio.
Em sua obra “História do Banho Frio”, publicada em 1701, Floyer afirmava que a água do mar era um remédio eficaz para diversas enfermidades, incluindo a paralisia.
Em 1749, outro médico britânico, Richard Frewin, reforçou os benefícios da água marinha no tratamento de doenças físicas e mentais.
E foi aí que a praia virou tendência. Pessoas em busca de tratamento médico passaram a recorrer ao mar para aliviar sintomas e enfermidades.
E no Brasil, como surgiu o hábito de ir à praia?
Com a chegada da Família Real ao Brasil em 1808, a ideia de praia como um local medicinal ganhou mais força. Também, pudera: olha o tamanho da nossa costa!
Segundo relatos, em determinada ocasião, Dom João VI sofreu uma infecção na perna após um ataque de carrapatos na fazenda de Santa Cruz, onde passava o verão. Para tratar as feridas, recebeu como prescrição banhos de mar, aproveitando as propriedades do iodo marinho.
Devido ao seu receio de crustáceos, principalmente caranguejos, o rei ia até a água dentro de uma liteira, na Praia do Caju, no Rio de Janeiro. Após submergir a perna por alguns minutos, os escravizados o retiravam. Em pouco tempo, se curou e não precisou mais recorrer à praia.
Como as ações da realeza sempre influenciavam os súditos, o hábito de tomar banhos de mar virou febre entre a população da então capital Rio de Janeiro, marcando o início da ocupação do litoral brasileiro para o lazer.
Mas, obviamente, todo mundo tomava banho de roupa. Os trajes nem de longe lembravam os biquínis e sungas que se popularizaram a partir dos anos 1960. O decoro, aliás, era uma preocupação na cidade fluminense. E existiam até mesmo horários específicos para tomar banho de mar! Especialmente, para as mulheres, é óbvio…
Em Santos, ir à praia era um evento
Por aqui, os primeiros registros de gente aproveitando a praia são do início do século XX. Pra começar, o vestuário era bem diferente. Lá pelos anos 1920 e 1930, quem quisesse tomar um banho de sol ou de mar precisava ir até a orla vestido como se estivesse indo à missa de domingo.
Foto: Fundação Arquivo e Memória de Santos (FAMS)
Segundo o site Memória Santista:
“Não era raro ver os cavalheiros com terno e gravata e as senhoras com vestidos garbosos e elegantes. Aqueles que, realmente, tinham a clara intenção de aproveitar a praia, se utilizavam das cabines de banhos que alguns empreendimentos hoteleiros e até outros empresários que não eram do setor de hospedagem, montavam na faixa de areia. Era lá, dentro daquelas pequenas cabines de madeira, que ocorria a transformação dos banhistas. De elegantes, saiam como se estivessem com um pijama para dormir”.
Vale lembrar que o pioneirismo de Santos foi imenso, até mesmo nos esportes na praia. O surfe no Brasil teve suas origens nas nossas ondas.
Bom, muita coisa mudou até hoje, né? Ainda bem, porque, agora, a gente pode ocupar as praias em Santos com liberdade e consciência.