Mulheres negras empreendedoras têm mais estudo, porém menos renda
Você já ouviu aquele papo de que estudar é o caminho para mudar de vida? Para as mulheres negras empreendedoras no Brasil – e na Baixada Santista -, a história não é bem assim. Mesmo com mais anos de estudo no currículo, elas continuam ganhando menos.
Os números são surpreendentes, de acordo com a mais recente pesquisa do SEBRAE, O novo retrato do negro empreendedor brasileiro – Sob a Ótica da PNAD Contínua.
Os números da desigualdade
A quantidade de empreendedores negros no Brasil chegou a 16 milhões em 2024, um salto de 31% desde 2012. No entanto, mesmo sendo maioria na população brasileira, as mulheres negras seguem enfrentando barreiras extras para empreender. E mais ainda, para lucrar com seus negócios.
Vamos aos detalhes do levantamento, que usou dados do período entre o 1º Trimestre de 2012 até o 4º Trimestre de 2024.
- Escolaridade: 65,4% das empreendedoras negras têm ensino médio completo ou mais, índice maior que o dos homens brancos donos de negócio (65,2%);
- Renda: Mesmo com mais estudo, as mulheres negras recebem menos de 40% do que os empresários brancos. Isso mesmo: menos da metade do rendimento deles;
- Comparando só quem tem ensino médio: 42,6% das mulheres negras donas de negócios têm essa formação, contra 33,7% dos homens brancos. Mas, ainda assim, elas seguem com renda muito inferior;
- Rendimento médio: No fim de 2024, o rendimento médio real dos negros donos de negócios foi de R$ 2.477. Portanto, o maior da série histórica. Mas, entre os donos de negócios, os negros ainda ganham 46,2% menos que os brancos;
- Desigualdade de gênero e raça: O rendimento das mulheres negras donas de negócios equivale a 73,1% do rendimento dos homens negros e só 52,5% do rendimento das mulheres brancas empreendedoras;
- Presença feminina: As mulheres já são 32,6% entre os negros donos de negócio e esse número cresce cada vez mais.
São 16 milhões de empreendedores negros no país
Mais de 70% dos empreendedores negros estão nas regiões Sudeste e Nordeste. E os principais setores de atuação são Serviços (41,7%) e Comércio (21,3%).
Uma notícia boa é que a formalização está aumentando. Isso porque 24,7% dos negócios de pessoas negras tinham CNPJ no fim de 2024.
Os desafios do cotidiano e das estruturas vigentes
Em um cenário em que 47% das mulheres que empreendem no Brasil são negras, nem tudo são flores. Porém, essas mulheres enfrentam questões bem específicas, como menor acesso a crédito. Pois é, 45% têm crédito negado, número 50% maior que entre empresárias brancas) e menor faturamento médio.
Apesar das dificuldades, o relatório Empreendedorismo Negro no Brasil, de 2022, mostra que iniciativas e redes de apoio locais conseguem aumentar significativamente a presença e a sustentabilidade de negócios liderados por mulheres negras.
E como fazer isso? Ao promover o compartilhamento de informações, acesso a espaços de poder (econômico ou político), criar oportunidades de capacitação e ajudar a dar visibilidade para histórias de quem transforma a própria realidade e a de sua comunidade.
No Brasil, Feira Preta, Preta Hub e o Movimento Black Money vêm protagonizando nos últimos 15 anos essas conversas extremamente necessárias junto a empresas, poder público e investidores. O jornalismo independente e cheio de personalidade do Alma Preta é outro exemplo que não pode ficar de fora dessa lista.
E em Santos e região?
O fortalecimento da mulher negra enquanto empreendedora, inovadora e líder começa a crescer e aparecer na cidade.
Sim, temos um histórico potente que remete a Alzira Rufino (Casa da Mulher Negra), Samara Faustino (Associação dos Cortiços do Centro) e até mesmo Djamilla Ribeiro, que é prata da casa. Mas é bem importante notar que as ações estão se multiplicando e ocupando novos espaços.
Desde 2019, o Coletivo AfroTu vem se consolidando como uma das referências que reúne marcas autorais, produtos artesanais, gastronomia e cultura negra. Fundado por Luciana da Cruz, filha de Dráuzio da Cruz (fundador da Escola de Samba Império do Samba), o coletivo tem como missão resgatar e valorizar a identidade afro-brasileira, fortalecer ações coletivas, sociais, arte, cultura, sustentabilidade e empreendedorismo. O coletivo promove feiras regulares e participa de eventos culturais como o Santos Arte Preta, oferecendo espaço e apoio para mais de 40 empreendedores negros. Recentemente, também abriu seu espaço físico, a Sala AfroTu.
Existem, ainda, políticas públicas municipais para essa população, entre elas:
- Sebrae Aqui Delas: Santos é a primeira cidade a receber uma unidade do Sebrae focada exclusivamente para mulheres, inaugurada em 2025 na Casa da Mulher;
- Festival de Afroempreendedorismo: no Mês da Consciência Negra, o festival conta com 40 expositores mulheres e homens negros;
- Edital Santos Arte Preta, exclusivo para pessoas negras e seus projetos culturais.
Pretitude na inovação
Outro destaque é o Fórum Mulheres Pretas Empreendem (MPE), uma das principais iniciativas em Santos de articulação regional do empreendedorismo feminino negro. Ele acontece todos os anos desde 2023 no mês de julho, em comemoração ao Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha (25 de julho).
A edição 2025 será no sábado (12 de julho), das 9 às 18 horas, no Parque Tecnológico de Santos.
O evento gratuito pretende gerar oportunidades para conectar, aprender e ampliar a rede de empreendedorismo entre mulheres negras.
O que vai rolar no Fórum Mulheres Pretas Empreendem 2025?
Em pauta, estão discussões como práticas de negócios, estratégias de liderança e cases de sucesso da Baixada Santista. E isso vale para quem já tem sua própria empresa e também para quem quer começar a empreender. As quatro fundadoras buscam construir um espaço aberto e inclusivo (por isso, é aberto para o público em geral) para trocas de experiências, apresentação de trajetórias inspiradoras e discussão sobre os desafios dessa população. Segundo elas, um dos focos é levantar discussões sobre as principais dores enfrentadas por quem toca o próprio negócio, desde a gestão financeira até a ampliação de contatos comerciais.
Garanta seu ingresso grátis aqui
Estarão por lá nomes como Ana Minuto, especialista em carreira, inovação e citada como uma das 100 personalidades negras mais influentes da lusofonia, além de Michelle Barreto (especialista em gestão estratégica de recursos humanos), Samantha Bertoldo (referência em estética avançada), Jorge Cerqueira (consultor de seguros), Larissa Aparecida (professora de inglês), com mediação de Vanessa Poskus, CEO da Uppo Brasil e Abraão Sena, empresário investidor.
Foto: Dayse Pacífico
5 maneiras de apoiar as mulheres empreendedoras negras
Ao fazer isso, ajudamos a promover igualdade, fortalecer a economia local e impulsionar a inovação.
1. Consuma de negócios liderados por mulheres negras
Priorize comprar produtos e serviços de empreendedoras negras, seja em feiras, lojas físicas, plataformas digitais ou redes sociais.
2. Indique, recomende e compartilhe
Recomende negócios de mulheres negras para amigos, familiares e colegas sempre que possível. Colabore com o engajamento e a visibilidade compartihando conteúdos, promoções e histórias dessas empreendedoras em suas redes sociais.
3. Ofereça seu tempo
Se você tem experiência em áreas como marketing, finanças ou gestão, ofereça mentoria ou consultoria voluntária para elas. Você também pode trocar por produtos e serviços.
4. Apoie as iniciativas e eventos da sua comunidade
Frequente (e consuma!) nas feiras, festivais e fóruns voltados ao afroempreendedorismo feminino, como o Fórum Mulheres Pretas Empreendem e a Feira Santos Arte Preta.
Se puder, articule com sua rede para realizar ou divulgar eventos e projetos que promovam capacitação, networking e visibilidade para mulheres negras empreendedoras.
5. Engaje-se nos movimentos
Apoie coletivos, ONGs e plataformas que fortalecem o ecossistema do empreendedorismo negro feminino, como as que citamos nesta matéria. Contribua financeiramente, seja como consumidor, doador ou investidor-anjo, em fundos e iniciativas dedicados a esse público, como o Fundo Baobá e o Fundo Agbara.
Por que isso importa?
Todos os números desta matéria, juntamente com as iniciativas como o Fórum Mulheres Pretas Empreendem e o AfroTu, deixam claro: a desigualdade de renda tem cor e gênero, e só vai mudar com políticas públicas, apoio e visibilidade.
No Juicy Santos, a gente acredita que dar voz e espaço para essas histórias é um passo importante para virar esse jogo. Afinal, o futuro do empreendedorismo também é preto, feminino e cheio de potencial. E precisa de espaços e de incentivo para brilhar.