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O Geppetto de Santos: documentário sobre oficina que ressuscita brinquedos conquista Hollywood

Dirigido por Marcio Rosario, "Brinquedoteca: a oficina mágica do seu Mauro" venceu como melhor documentário no Los Angeles Brazilian Film Festival e coloca Santos no mapa do cinema internacional

Tempo de leitura: 7 minutos

Se em Toy Story os brinquedos ganham vida quando ninguém está olhando, em Santos existe um lugar onde eles literalmente renascem pelas mãos de um Geppetto moderno. E essa história real acaba de conquistar Hollywood.

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No dia 5 de novembro é comemorado o Dia do Cinema, e Santos tem muito o que festejar. O documentário Brinquedoteca: a oficina mágica do seu Mauro, primeiro trabalho como diretor do ator e produtor santista Marcio Rosario, conquistou o prêmio de melhor documentário na categoria spotlight do Los Angeles Brazilian Film Festival (LABRFF), o maior festival de cinema brasileiro fora do país.

A premiação aconteceu durante a 18ª edição do festival. Esta edição foi realizada entre 13 e 16 de outubro de 2025, no histórico Culver Theater, em Culver City, Califórnia.

A história por trás das câmeras

Marcio Rosario não é novidade no cinema. Com mais de quatro décadas de carreira consolidada no Brasil, Europa e Estados Unidos, o santista já atuou em produções internacionais como Os Mercenários. Mais recentemente, ele esteve em A sogra perfeita 2. Desta vez, ele trocou a frente das câmeras pela cadeira de diretor. E o resultado não poderia ter sido melhor.

“Foi meu debut. Eu ia apenas produzir, mas quando procurei diretores, os valores eram absurdamente altos para um documentário sem orçamento”, conta Marcio.

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A solução veio de um amigo:

“Por que você não dirige? Você prepara elenco, dirige dublagem, dirige teatro. O que que você não dirige?”

Após uma noite inteira maratonando seus documentários favoritos, Marcio decidiu encarar o desafio.

Uma história de transformação e esperança

O documentário retrata a trajetória de Seu Mauro, fundador da ONG Brinquedoteca Eco. Desde 2006, ele transforma brinquedos descartados em alegria para crianças em situação de vulnerabilidade social na Baixada Santista. Natural de Fortaleza e morador de Santos há muitos anos, Seu Mauro dedica o tempo a limpar, consertar e restaurar brinquedos quebrados. Depois, ele doa tudo para creches e instituições sociais.

Mas a Biblioteca Eco de Brinquedos vai muito além de uma simples oficina de restauração. É um projeto cultural com base no conceito de “Toy Library” (Biblioteca de Brinquedos), reconhecido internacionalmente por seu potencial educativo, artístico e social.

“Ele é o nosso Geppetto”, brinca Marcio. “Tem essa magia de transformar não só os brinquedos, mas a vida das crianças e dos voluntários que trabalham com ele.”

A descoberta dessa história aconteceu por acaso. Durante a produção de Hannah, filme que venceu o prêmio de júri popular no Santos Film Fest, Marcio precisava de uma locação onde o personagem principal consertasse brinquedos. Foi assim que chegou à oficina de Seu Mauro.

“Quando conheci a equipe de voluntários, fiquei ainda mais fascinado. São pessoas que ele deu um propósito diferente.”

Cinema feito em Santos, sobre Santos

Produzido pela Três Tons Visuais Filmes, produtora fundada por Marcio em 2001, já acumula mais de 160 prêmios em festivais nacionais e internacionais. O documentário foi realizado com uma equipe majoritariamente santista, apaixonada pela causa. E sem patrocínio.

“Eu acabei sendo o principal investidor do projeto”, admite o diretor.

Mas o resultado valeu cada centavo. Artur Micheloto cuidou da edição e Kevelin Souza fez o som. Os dois formados pelo projeto Querô, do Instituto de Cinema de Santos.

“Cinema é equipe. Não adianta, não é o diretor, é todo mundo junto”, enfatiza Marcio. “Quando o Artur pegou o filme para editar, ele disse: ‘Qual que é o briefing?’ Eu respondi: ‘O que você quiser, eu confio em você’. E ele fez uma montagem onde 80% do que ele montou eu aprovei de cara.”

Mais que brinquedos: sustentabilidade e memória afetiva

Durante a edição, surgiu um elemento crucial: as “brinquedotecas”. São espaços onde as crianças não ganham os brinquedos, mas podem visitá-los e brincar.

“Em vários lugares carentes eu não tenho como dar 300 brinquedos, mas tenho como dar 100. Então eu crio a brinquedoteca. É quase uma biblioteca de brinquedos”, explicou seu Mauro.

O filme também traz uma reflexão sobre consumo consciente e economia circular.

“Estamos pegando brinquedos que tecnicamente estão sendo jogados fora e dando alegria de novo. Não existe brinquedo velho. O brinquedo vai ser reaproveitado, porque quando você recebe ele bonitinho, limpinho, ele tá novo”, destaca o diretor.

E há algo universal na história que tocou plateias do mundo inteiro.

“Quando você tem um personagem que o mundo consegue se conectar e ter empatia, fica mais fácil. O filme faz as pessoas pensarem nos seus próprios brinquedos, nas suas memórias”, reflete Marcio.

Reconhecimento internacional e próximos passos

Apesar da alegria da conquista, Marcio não pôde comparecer à cerimônia em Los Angeles por estar trabalhando em outro projeto no Brasil.

“Fiquei muito triste porque não pude ir. Recebia os vídeos, as pessoas mandando, pessoal chorando e eu chorando aqui”, lamenta.

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“Estou mais contente de saber que a história do Seu Mauro passou para outras pessoas, para outros idiomas. Recebi muita mensagem de gente que viu o filme e se identificou.”

Agora, o objetivo é claro: conseguir um espaço fixo em Santos para a ONG.

“Ele precisa de um espaço que possa lavar, que consigam costurar as roupas. Muitas voluntárias fazem em casa as roupinhas das bonecas. Mas ele precisa de um local.”

O diretor já está com um projeto ainda mais ambicioso na cabeça: um longa-metragem sobre a vida de Seu Mauro, os brinquedos e, principalmente, as crianças.

Santos no cinema mundial

Para Marcio, o filme representa mais do que um prêmio pessoal, é uma chance de colocar Santos no mapa e divulgar o trabalho social que acontece na cidade.

“Santos é uma cidade tão rica, mas Seu Mauro tem muita dificuldade em divulgar o trabalho dele. É por isso que fizemos o filme”, explica.

Marcio faz questão de evidenciar o talento local.

“Santos tem tantos profissionais capacitados. Às vezes, pela falta de oportunidades, acabam se mudando para São Paulo. Mas olha esse filme: saiu de pessoas que trabalharam no Querô, do Instituto de Santos.”

O Geppetto caiçara precisa de ajuda

A ONG Brinquedoteca Eco já ajudou mais de 100 crianças e transformou a vida de todos os seus voluntários. Um dos colaboradoras, por exemplo, conta no documentário como Seu Mauro mudou sua trajetória, tirando ele de situações difíceis.

Mas apesar do reconhecimento internacional, Seu Mauro segue sem financiamento e sem local fixo para continuar seu trabalho.

“Nesse momento, ele está usando a casa dele para fazer isso. Nossa missão é encontrar um espaço físico pequeno que ele possa fazer o trabalho dele”, reforça Marcio.

Qualquer pessoa ou instituição que tenha interesse em ajudar, seja doando brinquedos ou oferecendo um espaço, pode entrar em contato através da produtora Três Tons Visuais Filmes.

O Geppetto caiçara precisa de apoio para continuar dando um novo sentido a velhos brinquedos e transformando a vida de inúmeras crianças na Baixada Santista. E Santos, com certeza, tem motivos de sobra para se orgulhar dessa história.