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Deputados da Baixada votam para dificultar aborto legal para crianças vítimas de estupro

"PDL da Pedofilia" suspende norma que garantia informação e acolhimento a menores vítimas de violência sexual

Tempo de leitura: 5 minutos

Em uma das propagandas eleitorais mais emblemáticas (e tristes) do Brasil, o então palhaço Tiririca dizia que a situação do congresso era ruim, mas “pior do que tá, não fica”. Os eleitores elegeram Tiririca em 2010, e ele permanece na Câmara até hoje, em seu 4º mandato. Sua promessa saiu como um tiro pela culatra: o que já era ruim, piorou e muito.

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (5 de novembro) um projeto que pode dificultar o acesso ao aborto legal para adolescentes de até 14 anos em casos de estupro.

A votação teve placar de 317 votos a favor contra 111 contrários.

www.juicysantos.com.br - Deputados da Baixada votam a favor de projeto que dificulta aborto legal para vítimas de estupro menores de 14 anos

Apelidado de “PDL da Pedofilia” por aliados do governo, o projeto suspende os efeitos de uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), de dezembro de 2024, que regulamenta o direito de menores ao aborto legal.

Na prática, o texto impede que o Estado informe meninas vítimas de estupro sobre o direito ao aborto e realize campanhas contra o casamento infantil entre adultos e crianças.

Os três deputados da Baixada votaram a favor

Rosana Valle (PL), Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) e Delegado da Cunha (PP), representantes da região na Câmara, votaram pela aprovação do projeto.

Como se trata de um Projeto de Decreto Legislativo (PDL), caso o Senado também o aprove, o presidente Lula não poderá impedir sua promulgação.

O argumento dos defensores do projeto

Os parlamentares favoráveis ao projeto argumentam que o texto do Conanda permite o aborto sem o consentimento dos pais.

“A norma institui uma autonomia decisória completa, que dispensa qualquer tipo de autorização dos pais ou dos responsáveis pela criança”, afirmou a deputada Chris Tonietto (PL-RJ). Segundo ela, isso “prevê, na prática, uma submissão quase compulsória ao procedimento de aborto”.

O que dizem os dados sobre abuso infantil no Brasil

Saindo do campo do moralismo e analisando friamente os números, a realidade mostra um cenário alarmante:

Familiares e conhecidos são responsáveis por 68% dos casos de violência sexual contra crianças de 0 a 9 anos no Brasil. Segundo o Ministério da Saúde, pessoas próximas cometem o crime em 58,4% dos casos envolvendo vítimas de 10 a 19 anos.

Entre 2015 e 2021, o país registrou mais de 200 mil casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes. Foram notificados mais de 83 mil episódios envolvendo crianças e mais de 119 mil contra adolescentes, totalizando 202.948 casos. Em 2021, o número de notificações foi o maior registrado no período, com 35.196 casos.

Em dados mais recentes, o Brasil registrou 87.545 vítimas de estupro e estupro de vulnerável em 2024, o maior número da série histórica iniciada em 2011. Isso equivale a uma pessoa estuprada a cada seis minutos, segundo a 19ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

O perfil das vítimas é devastador: as autoridades classificaram 76,8% dos crimes como estupro de vulnerável (menores de 14 anos). Dentro desse universo, 61,3% das vítimas tinham até 13 anos, com a faixa de 10 a 13 anos concentrando o maior volume de casos. As mulheres negras correspondem a 55,6% do total de vítimas.

A questão que fica: se nesses casos a criança depender de familiares para abortar, que na grande porcentagem são os responsáveis pelos abusos, o que vai acontecer com ela?

Não há um número exato de quantas crianças são abusadas pela família no Brasil devido à alta subnotificação (menos de 10% dos casos são denunciados). No entanto, as estatísticas deixam claro que a maioria dos abusos ocorre no ambiente familiar ou por pessoas conhecidas. E os casos só estão aumentando.

Muito se fala sobre como o aborto pode impactar a saúde da mulher. De fato, é um procedimento invasivo. Mas as mortes nesses casos estão concentradas no aborto clandestino.

Segundo especialistas, o aborto legal realizado em condições médicas seguras apresenta riscos mínimos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, os abortos legais realizados pelo SUS aumentaram 71% entre 2018 e 2023. Em 2018, foram realizados 1.570 procedimentos. Em 2023, o número saltou para 2.687.

Será que não é justamente o aumento de proibições e a dificuldade de acesso à informação que está deixando o procedimento tão perigoso?

Vereadora de Santos se manifesta

A vereadora Débora Camilo (PSOL) utilizou suas redes sociais para se manifestar sobre a votação:

“De novo, Rosana Valle, Paulo Alexandre e Da Cunha votaram pelo retrocesso, revogando diretrizes que garantiam acolhimento a vítimas de estupro.

A maioria das vítimas são menores de 14 anos. A cada 2 dias, uma menina de 14 anos morre por causa de gravidez. Querem condenar meninas à dor e à morte.

A Baixada precisa de outros representantes na Câmara e na Alesp. Não dá mais para sermos representados pela expressão máxima do atraso político: violência, coronelismo e cretinice.

Criança não é mãe!”

Tiririca tinha razão?

A cada dia vivemos mais retrocesso, fruto da escolha da própria população. Estamos a menos de 1 ano das eleições. O brasileiro e a brasileira precisam pensar muito bem em cada voto. Votar certo para deputado nunca foi tão importante.

O que é chamado de “pior congresso da história” deu mais uma lição sobre retrocesso, em uma escolha que levanta apenas um questionamento: por qual motivo alguém aceita isso?

O voto do santista se torna cada vez mais importante. Escolham bem os seus representantes e não tenham memória curta.

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