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Como os novos pedágios na Rio-Santos vão impactar a área continental de Santos

Tempo de leitura: 7 minutos

Imagine pagar pedágio sempre que vai à padaria, levar os filhos à escola ou sair da Ponta da Praia até o Gonzaga para dar uma volta? Para os moradores da área continental de Santos, como Iriri e Caruara, isso pode se tornar realidade.

www.juicysantos.com.br - Novos pedágios na Rio-Santos tiram da área continental de Santos o senso de pertencimento

Esses bairros já convivem desde sempre com a sensação de distanciamento da cidade. Separados geograficamente, enfrentam diariamente desafios de mobilidade para acessar serviços básicos, trabalho e lazer no centro urbano.

Agora, com a implementação de novos pedágios free flow na Rodovia Rio-Santos (SP-055), o isolamento passa a se tornar, aos poucos, uma exclusão, tirando de mais de 6 mil pessoas o senso de pertencimento.

Por que haverá pedágio?

Tudo começou em novembro de 2024, quando a Concessionária Novo Litoral (CNL) assumiu a gestão de 212 quilômetros de rodovias que conectam o Alto Tietê, a Baixada Santista e o Vale do Ribeira. Desde então, muitos motoristas passaram a questionar como seria a administração da concessionária.

Em entrevista ao programa Café com Zaidan, em novembro de 2024, o CEO da CNL, João Couri Neto, prometeu melhorias na infraestrutura, duplicações e ciclovias.

Neto também afirmou que a CNL instalaria pedágios do sistema free flow, chamados de pórticos, mas que nos locais onde há cidades, não haveria nenhuma implantação de dispositivos de cobrança.

O CEO acrescentou que a cobrança só começaria após a construção de vias marginais, para que a população local tivesse uma alternativa sem ter que cruzar a rodovia, evitando a tarifa dos pedágios.

“A população começará a pagar após o serviço ser entregue”.

Preocupação em Iriri e Caruara

Contudo, em julho de 2025, o debate voltou com força. Isso porque um pórtico está previsto para o Km 236, na divisa entre os dois bairros. Essa é a única rota que liga a região continental ao centro de Santos, o que gera apreensão entre os moradores.

Diante disso, eles se mobilizaram. Como a isenção não está prevista em contrato, acionaram a CNL. Entretanto, a empresa alegou que seria preciso um reequilíbrio financeiro para avaliar a medida. Enquanto isso, um abaixo-assinado criado pela Sociedade de Melhoramentos de Caruara já reúne mais de 1.700 assinaturas. Caso não haja retorno, os moradores pretendem recorrer à Justiça.

Como funciona o sistema free flow

O sistema free flow promete agilidade nas estradas. Isso porque ele utiliza tags ou leitura automática de placas para reduzir filas. O valor previsto em edital é de cerca de R$ 2 por carro. Além disso, motocicletas terão isenção e usuários frequentes ganharão até 20% de desconto.

Foto: AESCOM ANTT

Quem tiver tag ativa verá o valor ser debitado automaticamente. Já quem não tiver poderá pagar em até 30 dias por site, aplicativo ou presencialmente em postos autorizados. Contudo, se o pagamento não ocorrer no prazo, há uma multa de R$ 195,23 e cinco pontos na CNH.

A visão dos moradores

Em entrevista para o jornal A Tribuna, os moradores dos bairros expressaram suas preocupações a respeito dos novos pedágios.

Segundo a vice-presidente da Sociedade de Melhoramentos de Caruara, Marcely Menezes, Iriri não tem padaria, escola ou hospital. Portanto, para serviços básicos, os moradores precisarão atravessar o pórtico diariamente.

Foto: Prefeitura de Santos

Para famílias de baixa renda, esse custo pesa no orçamento e dificulta o acesso a necessidades essenciais. Além disso, muitos trabalhadores que se deslocam para a área insular também serão diretamente impactados.

O que diz a concessionária

Em nota para o Juicy Santos, a CNL respondeu que assumiu em 1º de novembro de 2024 a gestão da rodovia, e desde então, os motoristas passaram a contar com uma estrutura operacional completa, ativa 24 horas por dia, que inclui atendimento pré-hospitalar com UTIs móveis, remoção de veículos, inspeção viária, combate a incêndios e oito Postos de Serviço de Atendimento ao Usuário (SAUs).

Paralelamente, está em andamento um amplo programa de conservação viária, com foco na recuperação do pavimento, melhoria da sinalização vertical e horizontal, iluminação, drenagem, contenções e outras intervenções essenciais para ampliar a segurança, o conforto e a fluidez do tráfego. Esse conjunto de investimentos iniciais será concluído antes do início da cobrança de pedágio.

Na primeira etapa do contrato, estão previstos pedágios nos km 236, 360, 369 e 389. Nos demais trechos da SP-055, a cobrança deve ter início apenas no quarto ano de concessão. Até lá, a CNL afirma que “executará investimentos importantes em infraestrutura”, como a implantação de vias marginais, novos dispositivos de acesso e retorno e ciclovias. Essas obras permitirão que os moradores utilizem rotas locais sem a necessidade de pagar pedágio, promovendo mobilidade urbana com inclusão e respeito às comunidades.

Assim que todas as definições forem concluídas, as informações sobre a futura cobrança de pedágio e demais serviços serão amplamente divulgadas, com antecedência, pelos canais oficiais da empresa.

Impacto dos pedágios na Baixada Santista

Além de Santos, os efeitos também atingem outras cidades da Baixada Santista. Atualmente, estão sendo instalados 11 pedágios na Padre Manoel da Nóbrega, impactando Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém, Peruíbe e Pedro de Toledo.

Desde então, vereadores e deputados regionais se mobilizaram contra a medida. O deputado estadual Caio França, por exemplo, alertou para os impactos:

“Com tantos pedágios, o frete vai subir, o turismo vai cair e o custo de vida será maior, mesmo para quem não usa as estradas”, disse ele.

Em um momento em que todas as cidades da Baixada Santista poderiam se beneficiar e crescer cada vez mais unidas, as ações do Governo do Estado dificultam esse trabalho em conjunto.

O papel do estado

A concessão das rodovias é uma parceria público-privada com o Governo do Estado e tem duração de 30 anos. Ao ser questionado, o governador Tarcísio de Freitas negou mudanças. Segundo ele, os pedágios são necessários para viabilizar as melhorias.

Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Em 2025, no entanto, Tarcísio recuou em relação aos pórticos na Rota Sorocabana e no Circuito das Águas após pressão política. Mesmo assim, ele não sinalizou nenhuma mudança para a Rio-Santos.

Onde entra o pertencimento nisso tudo?

Além do impacto financeiro, os pedágios trazem questões profundas sobre pertencimento e cidadania. Cobrar moradores para circular dentro da própria cidade, como em Caruara e Iriri, reforça a exclusão já vivida por comunidades periféricas.

Essa cobrança funciona como uma barreira simbólica. É como se esses moradores não fossem reconhecidos como parte de Santos. Mesmo morando, pagando impostos e votando na cidade, eles dificilmente se sentirão verdadeiramente santistas. Esse cenário tende a ampliar a fragmentação urbana que já existe na região.

Os bairros continentais enfrentam há anos a falta de integração. A oferta de transporte público é limitada e os equipamentos culturais são escassos. Agora, com os pedágios, os moradores veem esse distanciamento aumentar ainda mais. A sensação é clara: estão sendo empurrados para fora de um espaço que também lhes pertence.