Texto porVictória Silva
Jornalista, Santos

Sandrão e os doces mineiros

Chamou o elevador e desceu rumo ao trabalho. O sol quente, apesar de estar a dias do outono, o obrigou a colocar os óculos escuros e o ruído das ruas pedia um fone nos ouvidos.

Seguiu a caminhada até a Rua Euclides da Cunha (no Gonzaga), local onde encontrou sombra e movimentação em todas as horas do dia. Perfeito para as vendas. Perfeito para a sua nova realidade.

Já despido dos óculos e com um sorriso largo, Sandro – ou Sandrão, como é mais conhecido – encosta na calçada em frente à loja Casa das Alianças, estende longas conversas com o porteiro do prédio ao lado e vende doces mineiros e mel.

Quem passa por ali talvez não imagine, mas sua vida passou por uma reviravolta antes de a cadeira de rodas se tornar seu meio de locomoção.

Sandro

“Eu viajava o país a trabalho, como instrumentador industrial. Tinha 33 anos quando pulei de uma lancha, para um mergulho no mar, bati a cabeça e quebrei o pescoço. Tive fratura na 3ª e 4ª vértebra cervical e lesão na medula óssea. Fiquei tetraplégico”, diz, emocionado, apesar de descrever seu acidente com uma incrível objetividade.

O fato mudou sua vida. Ainda em 1995, aposentou-se por invalidez. Mas, com o passar dos anos, viu a defasagem entre inflação e aposentadoria dificultar as coisas.

“Hoje em dia vivo com a ajuda de familiares. Graças a Deus, não me falta nada. Mas é preciso trabalhar para dignificar o ser humano, né? Tentei fazer outras coisas, mas vender doces foi o que mais se  enquadrou com a minha realidade”, explica.

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O comércio de doces só é interrompido por conta de problemas de saúde. A falta de movimento fez com que a região dos glúteos do Sandro perdessem os músculos. Então, às vezes, a má circulação causa pequenas feridas.

“Nesse caso, preciso ficar alguns dias sem trabalhar, deitado e com remédios no local”. Esse problema também justifica a pequena jornada de trabalho, normalmente das 9 às 15 horas.

Enquanto escrevo esta matéria, Sandro provavelmente segue de volta pra casa. Por lá, encontrará uma cuidadora que já preparou seu almoço e arrumou as coisas. Após comer, ele conta com a ajuda dela para voltar à cama, local em que ficará até o próximo dia, quando a mesma mulher voltará para ajuda-lo a tomar banho e se vestir para mais um dia de trabalho.

Os doces mineiros são vendidos por R$ 15 (750g) e o mel, por R$ 20.