Texto porFlávia Saad
Santos (SP)

O pai do Tom

O mundo é cheio de dúvidas e contestações, e quando se é necessário que esse conhecimento chegue a um nova geração, o melhor lugar onde se pode encontrar respostas… é mesmo o Google. Na verdade, nesse caso, a Wikipedia.

Lá onde você pode descobrir que em grande parte do mundo, o Dia dos Pais é celebrado em junho, em razão do filho do rei babilônico Nabucodonosor e também no dia de São José (pai de Jesus). No Brasil, a data ficou para o segundo domingo de agosto, ideia de um distinto senhor chamado Roberto Marinho como incentivo à venda de seu jornal. Mas para mim será sempre dia 2 de junho.

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Não que nesse segundo dia de junho eu tivesse descoberto que iria ser pai, isso aconteceu uns oito meses antes, mas foi nesse dia dois que eu talvez tenha descoberto que não era mais nada, a não ser pai. Um tempo lá atrás eu talvez tivesse sido o editor e crítico do CinemAqui, tenha tocado no Same Flann Choice e produzido o Nerd Cine Fest, mas dali pra frente eu só seria pai.

Longe disso ser um problema, muito pelo contrário até, já que uma espécie de persona minha ainda acorda cedo todas as manhãs para trabalhar e acaba o dia cansado, mas quem está no comando esse tempo todo, deixou de ser o Vinicius Carlos Vieira.

Quem comanda tudo agora é o “pai do Tom”.

American Reunion

É ele quem tem toda a diversão e felicidade do dia, é ele quem fica feliz até trocando fralda, é ele quem anda pela casa ninando o pequeno quando esse não quer dormir. É ele quem acha tudo isso o ponto alto de seu dia.

É ele quem descobriu que à partir daquele dia 2 de junho teria um legado para criar e deixar. Uma responsabilidade que parece ser enorme, mas é um sopro de calmaria.

Sem ele ter feito quase nada, seu filho nasceu exatamente com a sua cara e seria confundido com suas fotos de bebê com um esforço menor ainda. O resto vem com uma facilidade mais incrível ainda. Em pouco tempo, ele tem certeza que o Tom e o “pai do Tom” serão quase a mesma pessoa.

Nesse momento a “mãe do Tom” (que também perdeu a identidade civil) deve estar achando que eu estou exagerando. Devo estar mesmo, mas acho que isso é coisa de pai. Um sentimento aflorado que parece não permitir que nada passe por ele sem ser captado. Do menor “aaagu” (que, na verdade, quer dizer “papai”!) ao primeiro choro, todo resto do mundo some e a atenção passa a ter um único foco.

Ser pai é ter a experiência de estar 100% vivo. De sentir tudo. De enxergar além de um olhar ou de um gesto meio destrambelhado em direção ao nada.

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Ser pai também é encaixar o filho em qualquer conversa como desculpa para sacar o celular e mostrar uma foto, assim como é uma vontade de arremessar a enfermeira longe e abraçar seu filho enquanto ela aplica uma vacina e você vê as primeiras lágrimas saírem pelo cantos dos olhos de seu filho.

Por outro lado, ser pai também é poder parar de escrever essas linhas, olhar para o lado e perceber que alguém está com os olhos arregalados em sua direção, dentro do carrinho e esperando por um carinho qualquer. Um gatilho para um sorriso que parece tomar todo recinto e curar qualquer cansaço e preocupação do Vinicius, que também o permite entrar em uma cabine telefônica, tirar os óculos e o terno e vestir o seu verdadeiro uniforme de “pai do Tom”.

Mesmo andando por ai todo orgulhoso com essa fantasia de pai, o herói não sou eu, talvez um sidekick, no máximo. Se tudo der certo, pelo menos um mentor que passa pela jornada desse, ai sim, herói. Alguém que fará qualquer coisa que está à mão para levá-lo para o melhor dos caminhos. Uma responsabilidade sem peso que todo pai carrega como se tivesse algum tipo de super-força.

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Do meu lado, um esforço para que esse pequeno se torne tão íntegro, justo, responsável e centrado quanto o Tom que inspirou seu nome e é o mais confiável dos filhos da família Corleone. Mas também que consiga tudo o que quer e passe pela vida com a mesma poesia que o Jobim. Que seja bonito como o Cruise e simpático como o Hanks, mas que se quiser cultivar um bigode, que seja como o do Selleck. Que persiga seus sonhos com a mesma persistência com que aquele outro Tom corre atrás do Jerry.

Um sonho que talvez seja até perder sua identidade e se tornar “pai de alguém”, até por que, mesmo sem eu saber o meu sonho era exatamente esse, deixar de ser o Vinicius e se tornar o “pai do Tom”.

*Vinícius Carlos Vieira é jornalista e parceiro do blog com o Cinemaqui. Este é seu primeiro Dia dos Pais ao lado do Tom.