Apesar de tudo, leve o Carnaval na alma todos os dias
Eu nasci em um sábado de Carnaval, com um bloco passando na frente do hospital Ana Costa bem na hora que minha mãe colocou os olhos em mim.
Comecei a frequentar a matinê da festa de Momo do Clube de Regatas Beira Mar, em São Vicente, com as minha tias aos 2 aninhos, vestida de fadinha. De lá pra cá, foram muitos e felizes carnavais.
Muito confete e serpentina. Algumas horas da infância vidrada assistindo o desfile de fantasias – categorias luxo e originalidade – da extinta TV Manchete. A tia Márcia tirando minhas medidas para criar, mais uma vez, meu figurino que ela fazia se tornar espetacular.
Fui rumbeira, odalisca, baiana, havaiana, melindrosa, grega e (a que eu mais amei) She-ra. Adulta, andei me convertendo ao sereismo.
Já desfilei nas campeãs de São Paulo e já cobri a primeira noite inteira de desfiles no Anhembi quando era repórter no Jornal da Tarde. Também teve bloquinhos, muitos bloquinhos, no Rio e na capital paulista. Fiquei com os olhos marejados quando vi de perto os bonecos gigantes e ouvi ao vivo a Orquestra de Frevo de Olinda na folia de 2018.
Enquanto escrevo este texto para vocês, ouço não muito ao longe clássicas marchinhas que animam moradores e visitantes de uma cidadezinha do interior onde meus pais têm um apê. Aqui do terraço, espio volta e meia lá embaixo numa tarde de terça de Carnaval meninas e meninos com as mais graciosas e fofas fantasias. Lá vai uma fadinha, como um dia eu fui.
Só brinquei um pouquinho a folia esse ano, no domingo à tarde, para não passar em branco. Precisei do feriado para me preparar para possibilidades que, bonitamente, se abriram nos dias seguintes. Queria também um tempo precioso com o meu pai, que há muito a gente não tinha juntos – e ainda me dar bem com ele comprando pasteis pra mim como quando eu era criança.
Mesmo não caindo na folia, ver as pessoas fantasiadas, o espetáculo das escolas de samba na TV, gente pulando nas ruas me dá sempre uma sensação boa de leveza, de alegria no ar. E em um início de ano com tantas tristezas coletivas profundas e em tão pouco tempo foi quase uma permissão pra se sorrir de novo. O Carnaval não resolve nossos problemas. Nunca resolveu. Mas ajuda a gente a lembrar que também estamos aqui para a felicidade.
Apesar de tudo, leve “carnaval” na alma todos os dias, na medida do possível. Coloque cor e brilho, como os das fantasias, na maneira como você trata quem segue a jornada com você. Porque tem uma parte da caminhada que é difícil mesmo. Em algum momento, dói pra todo mundo, por diferentes motivos.
Então, se abasteça o máximo que puder da alegria para ficar forte diante do inesperado ou do que já se anunciava (e você só não queria ver). Pra lembrar de como ela é quando chegam as tais tristezas e querer seguir novamente em sua direção. E em frente.
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Suzane é santista e cofundadora da plataforma Mulheres Ágeis e da consultoria ComunicaMAG. É jornalista, mestre em sociologia, professora e escritora. Autora do livro “Tem Dia Que Dói – mas não precisa doer todo dia e nem o dia todo”. Mãe orgulhosa da viralatinha Charlotte.