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A Praça dos Pokemons

Por mais que fuja do aplicativo, não dá para ignorar um fenômeno social como a fissura pelo Pokemon Go.

Meus filhos falam no assunto, meus alunos caçam as criaturas pela faculdade, testemunho gente a capturá-los pelos corredores do shopping.

E tomei a decisão de refletir mais a respeito quando passei pela Praça das Bandeiras, no Gonzaga.

O cenário ganhou outra dinâmica. Tive, de início, a impressão de que as pessoas estavam isoladas e juntas ao mesmo tempo.

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Sei que é assim, como uma das características do comportamento contemporâneo, mas nunca havia visto tanta gente unida com o mesmo objetivo virtual.

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Mais de 200 pessoas disputando as mesmas presas. Em meio a elas, o bonde como símbolo de outra definição de coletividade, de ontem e de hoje.

O Pokemon Go aguçou minha curiosidade depois da repetição de manifestações no Facebook. Quis entender o que era, ainda mais que meus filhos e amigos deles passaram boa parte das férias envolvidos com as criaturas japonesas, mas na versão card game.

Nunca comprei certas versões apressadas que classificam os jogadores como retardados. Ou que é uma bobagem de jovens. Até porque não vejo diferença de certas postagens de comida em rede social ou os selfies durante shows, jogos de futebol e afins. São variações do mesmo tema, da mesma forma de viver, essa sim passível de reflexão.

A Praça das Bandeiras me soa como a versão pós-moderna da Grécia Antiga. Lá atrás, nasceu o conceito de praça pública, endereço onde eram decididas questões coletivas, via debates, via filosofia.

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A praça da atualidade é, no cotidiano, somente local de passagem, salvo exceções como as comemorações na Praça da Independência, em Santos. Comemorações quase sempre limitadas ao futebol e, eventualmente, celebrações políticas como os protestos contra o PT.

O uso da Praça das Bandeiras pelos jogadores-caçadores me faz pensar sobre um ponto que tangencia o papel da praça. Os jogadores representam, acima de tudo, a nova noção de público e privado.

Os jogadores de Pokemon Go são mais um exemplo – até aí, nada de novo! – de como nos comportamos com os aparelhos que seriam extensões de nossos corpos, assim profetizou Marshall Mc Luhan, na década de 60.

Os limites se alteraram, se estenderam. Se o jogo é privado, individualizado, o local das ações é público.

A interatividade oscila entre o físico e o virtual. As comunicações vagueiam entre o olho no olho e a tecnologia dos aparelhos móveis.

O aplicativo Pokemon Go, na orla da praia, expõe – de maneira involuntária – a transição que vivemos, os paradoxos que, por vezes, nos recusamos a admitir como prática.

O que acontece na Praça das Bandeiras só é a notícia do dia, repetida como ação humana e destinada a morrer em breve.

Nada inédito digno de horror ou expressão de surpresa.

As redes sociais já mostram, há alguns anos, como ainda temos dificuldades para lidar com a exposição pública, que inclui a leitura até certo ponto ingênua das ferramentas tecnológicas.

Fingimos anonimato enquanto desejamos os dividendos do reconhecimento público, para não dizer a fama instantânea. Queremos olhar pelo buraco da fechadura alheia enquanto fechamos portas e janelas e pedimos silêncio depois de entupir a sala de jantar de gente estranha. Julgamos e apontamos o dedo enquanto recebemos conivência e compaixão ao virarmos réus, com ou sem justiça, em sessão transmitida ao vivo.

A vida editada do mundo virtual apenas ganhou um novo jeito de ser contada.

É preciso pertencer, seja lá como os grupos se formam ou se desfazem. É essencial ser visto e o mundo dos aplicativos nos colocam no palco, nos tornam assuntos, nos integram à agenda criada por todos e por ninguém.

A Praça das Bandeiras é, para mim, um terreno fértil de observação. Não tenho paciência com jogos.

Tenho curiosidade sobre as pessoas. Até porque, se a coerência pública-privada for mantida, o Pokemon Go vai se juntar, em breve, ao clube dos fenômenos mortos, com sepultura ao lado do avô Tamagochi, do primo Orkut, entre outros seres tecnológicos em ciclos de vida que mal consigo acompanhar.

A praça, pelo menos, é vida que pulsa. Se é real ou virtual, depende de qual aparelho você vê ou carrega nas mãos.

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