Texto porLuiz Fernando Almeida

Ser Gay aos 40

Esse ano eu completo 40 anos de idade. Para o meio gay, já sou considerado “maricona” embora não me sinta dessa forma.

Dizem que a vida de fato começa aos quarenta. Eu não me sinto velho, mas já não me permito pagar certos micos porque não me sinto confortável em determinadas situações.

Ser gay aos quarenta e vivendo em Santos é um pouco esquisito.

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Foto: Adilson Felix

É uma idade em que você até curte um agito, mas prefere ter encontros e saídas mais produtivas com pessoas que tenham algo a lhe dizer e acrescentar ao invés de viver a vida como se não houvesse amanhã.

A cidade, ou melhor, a Baixada Santista, não nos oferece muitas opções de lugares e acabamos frequentando as boates que estão lotadas de jovenzinhos descobrindo o sexo, a noite, a popularidade e todos os prazeres que os vinte e poucos anos nos reservam.

Então, sair aqui pra se divertir tem sempre aquela sensação  dejavu, embora eu consiga aproveitar algumas vezes porque não entro numas e danço conforme a musica.

Pra namorar também é complicado ne?

Vejam: estou com 39 anos, solteiro. Não sou nenhum modelo de passarela, nenhum Deus grego, tão pouco um marombeiro, mas perai, não sou de jogar na lata do lixo. Sou ajeitadinho, limpinho, inteligente e divertido e bom de cama. Claro, tenho bilhões de defeitos, mas as qualidades se sobrepõem a eles. E mesmo assim, acho difícil, pra não dizer impossível, conhecer alguém com idade aproximada a minha, disposto a se relacionar verdadeiramente e de peito aberto que more em nossa cidade. Os caras com idade aproximada à minha, ou já tem alguém, ou não querem saber de nada serio porque já viveram outras relações e preferem focar no trabalho, status e dinheiro. Muito chato viver a vida assim. E o pior é que cada vez mais as pessoas fazem esta opção.

A minha geração viveu intensamente o medo do HIV e se comprometia com maior facilidade na juventude. Talvez pelo medo do contagio que não assombra esta geração.  Hoje, tudo ficou muito rápido e sinto que cada vez menos, as pessoas se interessam por alguém de verdade. Elas se interessam pela imagem do outro. O corpão é fundamental e isso já basta para alguém querer se relacionar contigo. Projeção em cima de projeção. Mas num mundo onde a essência de tudo vem se perdendo, vale apenas a embalagem pra tirar um selfie e matar as amigas de inveja.

Me recuso a entrar em academia pra ter o corpão da mUÓda. Me recuso a tentar ser igual pra não me sentir invisível. Afinal de contas, eu lutei a minha vida inteira pra ser diferente. E hoje, agradeço por ter personalidade própria e saber muito bem o que eu quero. Essa é uma das vantagens desta idade. Alem de ficar mais seletivo, você já sabe o que te faz mal e evita aborrecimentos com maior facilidade.

Muita gente chega aos quarenta e se recolhe. Acha que deve levar uma vida mais sossegada e tranquila. Eu concordo em partes, mas não acho legal quem se entrega pra vida como se nada fosse mais interessante. A vida esta só começando e eu acho que estou entrando na melhor fase dela em todos os aspectos: profissional e pessoal. O campo amoroso, a Deus pertence e só ele sabe.

Tenho conversado com gays da minha geração e percebo que todos estão desacelerando um pouco. Eu me incluio nesta estatística. Mas percebo também que muita gente acaba se excluindo por não sentir-se adequado pra viver na comunidade LGBT que e cheia de preconceitos (sim, e verdade) e padrões estéticos rígidos. Ora, lindinha!  Panela velha, é que faz comida boa.

Particularmente, eu acho que os homens ficam mais atraentes a partir dos quarenta, mas gosto e quem nem c**, cada um tem o seu.

Outro dia, numa discussão com uma amiga (agora acho que não é mais) eu ouvi em alto e bom som: Sua bicha velha! Aquilo doeu nos meus ouvidos por alguns minutos. Mas eu pensei, e respondi: Sou sim, e tenho aprendido muito com a idade. Tomara que você também tenha a mesma oportunidade.

Quando tinha 10  anos, imaginava que os anos 2000 seriam como o desenho animado Jetsons e que aos 40 eu estaria tecendo crochê. Aqui estou em pleno ano de 2014 e nada do que pensei na adolescência se concretizou. Sinto-me mais vivo e produtivo do que nunca.

Desde a adolescência fui de escrever e falar o que penso e por isso tenho certeza de que sou ator e trabalho com comunicação.

Na questão que envolve minha orientação sexual, sei que faço parte de um grupo seleto. Muitos homossexuais são vítimas de preconceito, não tem uma condição financeira boa e nem um trabalho digno.

Nesta caminhada só sinto falta do carinho da minha família. Mas tenho que seguir em frente com as conquistas que obtive e das quais sinto um imenso orgulho.

Contrariei muitas das expectativas para um homossexual nascido em um país homofóbico e machista e criado por uma família homofobica e machista. Planto sementes contra a homofobia e conquisto meu espaço como profissional.

Daqui a 20 anos quero estar aqui contando para vocês como cheguei aos 60.

Espero chegar lá com a dignidade que permeia minha vida desde que nasci.