Texto porLuiz Fernando Almeida

Chega de homofobia em Santos

Já sabemos que Santos, infelizmente, é uma das cidades mais homofóbicas do país. Além disso, é hipócrita, visto a quantidade de homens que levam vida dupla por aqui.

Claro esse não é um “privilégio” nosso, mas Santos trata isso com normalidade. O  ideal aqui é não se assumir, herança da “sociedade santista” da década de 80 que perdura até os dias de hoje.

www.juicysantos.com.br - caso de homofobia em santos

Um casal de namorados hétero pode trocar carícias como um abraço e um beijo no rosto, uma bitoca em público, mas você sente-se agredido por uma manifestação de afeto entre pessoas do mesmo sexo? Então eu preciso te dizer uma coisa:  se tratar!  

Tenho muitos amigos heteros, beijo praticamente TODOS no rosto, abraço todos. Tenho um amigo hetero, de verdade, que não tem o menor problema em dormir de conchinha comigo, sabem por quê? Porque ele tem plena convicção de sua sexualidade, além de ser um ser humano afetuoso.

É um absurdo as pessoas saírem impunes de um ato homofóbico como este. Estamos em 2014, acordem!

Mais uma vez, constatamos o despreparo dos comerciantes locais para lidar com clientes. Sim, CLIENTES, pessoas que PAGAM, CONSOMEM e devem ser tratadas com respeito, não interessando sua condição sexual, sua aparência e tudo mais.

Além de discriminar seus consumidores, o dono deste bar teve a coragem de publicar na pagina do estabelecimento no FB, reafirmando que em seu bar, gays não são bem vindos. Depois apagou o post, mas ja rolavam prints pela rede. Quando percebeu o tamanho da merda que havia feito, foi lá na pagina novamente, pedir desculpas. Meu amigo, desculpá-lo por que? Você não merece desculpas, merece cadeia, processo e ter seu bar fechado pra entender que não tem o direito de fazer isso com as pessoas.

garga

Li bastante a respeito deste caso nas redes sociais e tem de tudo: gente defendendo o bar, o dono, a família do dono, post de arrependimento do dono do estabelecimento (agora é tarde, fio!), gente retaliando o casal pela escolha de se manter anônimo, gente achando que gays devem viver no gueto e não frequentar espaços “heteros” (zzzzz) e mais um monte de baboseira.

Eu fui procurado pela amiga do casal que fez a denuncia aqui no blog lá na pagina da SANSEX, solicitando ajuda pra divulgar o Beijaço que acontecerá amanhã em frente ao bar. Entrei em contato com ela e consegui uma entrevista com o casal.

Para minha surpresa, um dos meninos já foi assistir meu espetáculo, Dama da Noite, algumas vezes.  Sei que é um menino bacana, inteligente, com quem tive a oportunidade de conversar algumas vezes e, por isso, entendo a opção do casal em se preservar.

Eu super entendo porque pago um preço alto por me expor sem medo. E não somente com os heteros, entre os gays, o preconceito também existe. E olha que eu só interpreto um personagem que usa salto alto e maquiagem. Já é o suficiente pra ser humilhado por aí. Eu nao me abalo, meu trabalho está acima de tudo. O sonho de qualquer ator é ser reconhecido por seu personagem. Eu consegui, mas tem seu preço.

Julgamentos à parte, isso não pode ficar impune. Imaginem se a moda pega na cidade? Daqui a pouco, estaremos restritos aos espaços gays. É uma cidade como esta que vocês querem? Acha justo esse tipo de discriminação não ser penalizada?

Aqui, tudo relacionado à comunidade LGBT é tabu. Gays morrem e fitas de vídeo que comprovariam a autoria do crime somem. E não se fala mais nisso… Até quando vamos abaixar a cabeça e aceitar este tipo de coisa? Até quando viveremos restritos aos guetos? Isso não funciona mais.

É chegado o momento de a comunidade se unir e mostrar sua força.  A juventude precisa entender que tem tudo a seu favor hoje em dia. É preciso conhecer seus direitos.

Tem muita gente bacana aqui como a Dra. Rosangela Novaes, Patrícia Gorsih, Tayane Myake, OAB Diversidade, lutando pra que tenhamos uma vida digna. Mas não adianta essas pessoas existirem se a comunidade é covarde.

Chega, mona! Levanta a bunda dessa cadeira no sábado à noite e vai lá na frente do bar participar do beijaço. É um ato político e um momento de união. Não somente pelo casal, mas para que não precisemos mais ouvir historias tristes como esta.

Vale lembrar que os amigos do dono do estabelecimento convocaram para o mesmo dia e horário um beijaço hetero. Espero não haver confusão e baixaria.

Não nos acovardemos. Infelizmente eu não poderei comparecer porque trabalho no horário, mas torço pra que tudo corra bem e que possamos viver numa cidade que respeite sua população independentemente da sexualidade de cada indivíduo.

Torço, sinceramente, para que o dono deste estabelecimento seja punido.

Abaixo, meu papo com o casal:

1)      Conte-nos como ocorreu o caso …

Estávamos saindo para encontrar com um casal de amigos (heterossexual) que nos convidaram para ir àquele bar que um de nós já havia frequentado com amigos. Ficamos em uma mesa apertada e pedimos alguma bebida pois ainda estávamos esperando mais um casal de amigos que era conhecido pelos donos do bar. Em determinado momento, recebemos uma ligação desse casal que avisou estar chegando, então nos esprememos para que eles coubessem. Nesse momento, meu namorado passou o braço nas minhas costas, me abraçando, o que foi seguido de um beijo no rosto dele, essa foi a única demonstração de carinho que tivemos durante nossa estadia no bar.

Após isso, chamamos os atendentes pois queríamos pedir algo para comer, chamamos três vezes até que na última ele veio e disse “só deixa eu falar uma coisa, aqui não dá certo casal gay não”, ninguém ouviu direito e eu pensei que ele falou que não ia casar ninguém não, pois eram dois casais, mas ele repetiu mais duas vezes, deixando bastante claro. Não anotou nosso pedido e foi embora. Ficamos ainda um tempo sem entender o que havia acontecido, ouve-se o tempo todo sobre casos de homofobia, mas quando acontece com você, simplesmente não dá para tomar uma atitude na hora, você trava.

Levantamos, fomos ao caixa, pagamos e fomos embora para outro bar, não queríamos estragar a nossa noite.

2) Já tive a oportunidade de vê-los na rua, caminhando de mãos dadas no Gonzaga numa tarde qualquer. Vocês estavam trocando algum tipo de caricia no bar?

Não, como dissemos, o beijo no rosto e o abraço foram as únicas trocas de carinho que tivemos. Mesmo andando na rua, evitamos andar de mãos dadas devido aos riscos que um casal homoafetivo corre. Por isso, dentro de algum estabelecimento (shoppings, lojas, restaurantes), trocamos algum carinho que chega a ser no máximo um selinho.

3) Algum de vocês já foi vítima de homofobia anteriormente?

Eu, diretamente não. Se contar as piadas e comentários não direcionados para mim, o tempo todo.

4) Que medidas vocês tomaram a respeito deste caso?

No momento foi registrado um B.O. para documentar o ocorrido e estamos tomando as medidas legais, baseadas na Lei Estadual 10948/01.

5) Vocês sofreram algum tipo de ameaça?

Acreditamos que permanecer no anonimato foi o que evitou que alguma retaliação acontecesse. Amigas que se expuseram já sofreram comentários negativos no Facebook e nós, enquanto “casal sem nome”, já fomos criticados também.

6) Como vocês estão após o ocorrido?

Caminhando. Apesar de algumas pessoas não pararem para pensar, ser “apenas” insultado em um bar pode parecer bobo, mas os motivos que levaram a esse insulto não são nada bobos. É algo que dói muito, é uma dor que tem história. Quando se passa por uma situação dessas, você lembra que o tempo todo você pode sofrer alguma violência apenas porque você não ama quem querem que você ame. A homofobia parece uma sombra que te segue e você nunca sabe quando vai aparecer, só sabe que aparecerá. O que aconteceu nos abalou mas não nos amedrontou. A escolha do anonimato é apenas por questão de preservar-nos de alguma ameaça que poderia acontecer.